A Justiça do Trabalho: os limites de sua despesa
Alexandre Azevedo Silva é Juiz do Trabalho de Guaraí - TO e, no momento, Juiz Auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça - CNJ. É um excelente juiz e vem prestando bons serviços ao CNJ.
Em recente artigo publicado no informativo da Associação dos Magistrados do Trabalho da Décima Região (Distrito Federal e Tocantins) ele anota que em 2004 o crescimento médio do PIB brasileiro foi de 5,2%, caindo para 2,3% em 2005. Mas nesse mesmo ano de 2004 o orçamento da Justiça do Trabalho cresceu 18%, mais de três vezes o crescimento do PIB. Por isso ele alerta que não pode o Poder Judiciário almejar crescer três vezes mais que o resto do país, conta que, em breve e certamente, não poderá mais ser paga pela sociedade, que igualmente carece de recursos públicos para custear outras necessidades básicas como saúde, educação, moradia e segurança.
O alerta tem toda procedência e Alexandre Silva revela compromisso social e serena coragem. É bom mesmo que a magistratura trabalhista, treinada para a sensibilidade social, compreenda o fenômeno e se antecipe aos seus efeitos.
Depois da Constituição de 1988 o orçamento do Poder Judiciário vem crescendo em relação ao do PIB. É compreensível que assim seja. Afinal, sem Poder Judiciário autônomo não existe Estado Democrático de Direito. E sem recursos - financeiros, materiais e humanos - não existe Poder Judiciário.
Na Grécia Antiga o dilema dos governantes era entre fabricar arados ou espadas. Agora os dilemas são outros. Mas certo é que há mesmo limites para o crescimento do orçamento público, nele incluído do Poder Judiciário. O que Alexandre chama a atenção é que esse limite está chegando e com ele as restrições ao crescimento do Poder Judiciário.
Uma solução óbvia é melhorar drasticamente a capacidade resolutiva do Poder Judiciário, com uso intensivo de informática e treinamento de magistrados e servidores. Mas essa é uma solução interna. Há uma variável externa, não é controlável pelo Poder Judiciário, que é a constante expansão da demanda forense. Desse ponto em diante o problema é tanto da sociedade política quanto da sociedade civil.
E a redução da demanda forense só será conseguida com a redução da conflitividade. Uma sociedade - e um Estado - menos conflitivo só será possível com maior desenvolvimento humano. E nessa matéria precisamos todos fazer o dever de casa.
Comentários
É louvável a preocupação do Juiz Alexandre Azevedo; poucos vezes vi membros da magistratura (ao menos em nosso Estado) com uma visão sócio-econômica do Judiciário tão acurada e, você têm razão, tão corajosa.
Concordo com você quando diz que o aumento das demandas forenses é um componente externo a ser considerado. A conflitividade das relações de trabalho, mesmo com o prestígio dado pela Constituição de 1988 aos sindicatos (ou será que por causa disso?), foi muito acentuada nos últimos anos. Na área cível, a representatividade de órgãos de defesa dos direitos coletivos e difusos, apesar de também acentuada após 1988, não conseguiu deter o avanço das demandas individuais.
Qual seria a solução para esses problemas? O debate é pertinente: não adiantará de nada reformar as leis de processo, instrumentos de atuação do Judiciário, se não houver uma preocupação real com o crescimento exponencial das demandas. Mas obviamente que diminuir o acesso ao Judiciário não é o caminho certo desta encruzilhada.
Talvez uma boa solução seja dar maior importância à mediação. A Defensoria Pública do Estado, em atitude louvável, já implantou seu centro de mediação, com treinamento dos servidores a ela vinculados. Por que não fazê-lo em outros órgãos? Por exemplo, por que não enfatizar a necessidade de conciliação prévia nas câmaras referidas pelo art. 625-D da CLT, no caso das demandas trabalhistas? Por que não retomar, na Administração Pública Estadual, a idéia de uma comissão formada por representantes de diversos órgãos (das áreas financeira, jurídica, de planejamento) para debater e achar soluções, inclusive conciliatórias, de demandas repetidas de servidores públicos?
Por outro lado, e transmudando um pouco o foco da discussão, entendo que a sociedade deveria reclamar do Judiciário maior transparência e publicidade na arrecadação de custas e emolumentos cobrados dos litigantes. Afinal, para onde vai esse dinheiro? O que, desses valores, retorna ao Judiciário para complementação de seu orçamento? Existe esta complementação?
Por fim, felicito-o pela iniciativa do blog. Os blogs vêm se tornando cada dia mais importantes para a democratização da notícia e da manifestação da opinião pública, e a participação de uma autoridade - em especial do Poder Judiciário, tão pouco afeito à discussão "externa-corporis" de sua realidade - é extremamente salutar.
Agradeço seus comentários, pertinentes e certeiros.
Nos Estados Unidos, por iniciativa dos próprios magistrados, foi criado um sistema multiportas, onde a solução ou composição judicial do conflito é apenas uma delas. As outras portas vão desde a mediação e a arbitragem até à assistência social ou psicológica. Muitas vezes conflitos são de difícil composição judicial porque tem outra natureza (psicológica, social, política etc).
Aqui, pelo menos por enquanto, esse é um tema sem encanto. Continuamos aferrados à composição estatal - judicial, quase sempre - dos conflitos, os mecanismos de prevenção de conflitos são incipientes e a sociedade é pouco afeita à auto-composição dos conflitos que nela surgem conflitos. Quando o conflito é com o Estado, então, ele se eterniza.
Acredito que assim é - e será ainda por muito tempo - porque (1) o debate do tema é quase interditado e (2) a sociedade civil ainda não se interessou de verdade pelo tema (quase um monopólio nosso, quero dizer, dos juristas).
Aqui no Sindicato dos Bancários, aprovamos em assembléia dos funcionários do Banco do Brasil a instalação da Comissão de Conciliação Prévia, que é um dos caminhos para desafogar a Justiça do Trabalho.
Segundo o acordo coletivo a ser assinado com o BB, a CCP não será obrigatória, mas uma alternativa aos ex-funcionários do Banco do Brasil. Se houver acordo, dá-se a quitação apenas nas parcelas acordadas e não em todos os direitos a que o trabalhador faz jus.
Um grande abraço e vida longa ao blog.
Agradeço a leitura e o comentário.
Que bom que finalmente os bancários do Banco do Brasil resolveram seguir os passos dos bancários do Banco Itaú, onde essa Comissão de Conciliação Prévia já existe, com excelentes resultados.
Espero agora que o Banco aceite.
Confiando na seriedade das partes - Sindicato e Banco - tenho esperanças que (1) a conflitividade no Banco do Brasil seja reduzida e (2) da experiência resulte recuperação - mesmo que gradual - do prestígio das Comissões de Conciliação Prévia, erodido pelas baixas práticas de alguns sindicatos e empresas.