A NOVA SUDAM, VISTA POR ARMANDO MENDES

Armando Mendes é um sábio - um dos nossos sábios amazônicos - um inventor da Amazônia, o criador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, o nosso NAEA velho de guerra. Abro alas para ele e publico aqui, com muita honra e gosto, seu recente artigo sobre a lei da Nova SUDAM. É leitura recomendada para nossos parlamentares, governantes e governados.



A LEI DA NOVA SUDAM

Armando Dias Mendes
Professor aposentado da UFPA
As Leis Complementares nos. 124 e 125, de 3 do corrente e publicadas dia 4 “instituem” a Sudam e a Sudene, respectivamente. 1
A seguir, um comentário básico sobre as implicações nelas contidas à luz dos vetos parciais que o Poder Executivo lhes apôs (Mensagens Presidenciais nos. 1 e 2/2007, enviadas e publicadas nas mesmas datas).2
Aqui, porém, vou deter-me essencialmente no caso específico da Amazônia.
A controvérsia
O anúncio, após quase quatro anos de tramitação, parecia consagrar a esperança de uma ação efetiva em cumprimento ao disposto no art. 3º, III da Constituição vigente.
Neste inciso é dito que um dos “objetivos fundamentais da República” é “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”. Numerosos outros dispositivos estabelecem ou anunciam instrumentos com tal propósito. O art. 43, ora regulamentado, é, deles todos, o mais abrangente e as Leis Complementares 124 e 125 a ele se vinculam.
Às reflexões a seguir, por sumárias e incompletas. Devem ser-lhe apostas (ou contrapostas) outras análises econômicas, sociais, políticas, jurídicas.
A nova Sudam, segundo a lei
A Lei Complementar nº 124 explicita no seu preâmbulo, como referido, que ‘institui’ a Sudam.
1. Em resumo, são suas finalidades e competências (arts. 3º e 4º):
Promover e agir no sentido do “desenvolvimento econômico, social e cultural e a proteção ambiental da Amazônia”.
Mas “desenvolvimento includente e sustentável”, ademais da integração competitiva na economia do Brasil e na do mundo.
2. São seus instrumentos de ação (art. 5º):
Planos regionais, articulados com os federais.
Os Fundos específicos (FNO – Fundo Constitucional de Financiamento do Norte e FDA – Fundo de Desenvolvimento da Amazônia).
Incentivos e benefícios fiscais e financeiros e outros instrumentos.
3. São -- ou seriam, como veremos -- seus recursos (art. 6º):
Dotações orçamentárias anuais.
Percentual sobre liberações do FDA.
Resultados de aplicações financeiras e outros recursos.
Por fugir aos objetivos imediatos, passa-se por cima dos delineamentos institucionais básicos da novel Sudam (arts. 8º a 12).
4. Mas sempre convém registrar algumas provisões e previsões do Plano Regional de Desenvolvimento da Amazônia (arts. 13 a 15):
A lei após o veto
Destacam-se os pontos principais.
1, O art. 15, em si, foi vetado sob a alegação de que a matéria “por ser orçamentária, é estranha ao escopo do Autógrafo do Projeto de Lei”. Desse modo o Orçamento da União não será ‘regionalizado’ como determina a Constituição.
Óbvio: aqui não se está falando em PPA, LDO e similares, que têm seu nicho próprio na Constituição.
2. O veto, como se pode ver a seguir, na prática esteriliza qualquer veleidade de capacitação operacional da Superintendência.
A nova Sudam após a nova lei e seu veto ‘parcial’
O veto é dito ‘parcial’ porque não incide sobre toda a lei. Mas incide sobre pontos centrais, as definições chave da nova autarquia. A saber:
De saída, é tornada sem efeito a meta (Par. Único do art. 5º) de se alcançar na região o patamar de 90,0% do PIB per capita do País como referencial para a redução das desigualdades regionais.
A preocupação maior, porém, está condensada na nova redação dada pelo art. 16 a dispositivos da Medida Provisória. Assim, foi cassada (ou caçada...) a nova redação dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 4º da MP 2.157-5.
Se aceitos os vetos, resultará o seguinte:
Desaparece a garantia de reproduzir no Orçamento entre 2006 (sic) e 2023 o valor atualizado da dotação de 2005 em favor da ADA (art. cit., § 1º).
Os saldos da Sudam em um exercício financeiro já não passarão para o exercício seguinte em sua conta (id., § 2º).
Ao mesmo tempo, é apagada a proibição de submeter as dotações orçamentárias da Sudam a quaisquer restrições (id., id.).
Não existe mais a obrigação de o Tesouro depositar religiosamente, em duodécimos, até o dia 20 de cada mês, a verba do exercício (id., § 3º).
3. Por outro lado, de nada adianta o art. 19, que não foi vetado, seguir dizendo que “a Sudam sucederá a ADA em seus direitos e obrigações”:
Foi vetado também o art. 17, que repassava à Sudam todos os saldos existentes em nome da ADA à data da sucessão desta por aquela.
A nova Sudam começará, pois, de caixa totalmente vazio.
E tudo depende de decreto do Executivo, sem prazo para ser baixado, que estabelecerá a estrutura regimental e a base para criação dos cargos em comissão da nascitura Sudam. Contudo:
Assim, não será excessivo imaginar um cenário em que, por falta de apreciação do veto e postergação do decreto de regulamentação, a Sudam não seja instalada em prazo curto e a ADA ganhe sobrevida.
Nova Sudam ou velha Spvea?
Eis a questão.
Uma tentativa de síntese do exposto mostrará que, na prática, não se estará ressuscitando a Sudam, mas quem sabe a Spvea.
Com efeito:
O Plano Regional precisará ser aprovado pelo Congresso Nacional, mas o Primeiro Plano Qüinqüenal da Spvea, de 1954, nunca foi apreciado.
Dependerá de dotações orçamentárias, como era antigamente, embora fossem então determinadas na Constituição de 1946, em seu art. 199.
Essas dotações serão agora sujeitas a contingenciamentos e retenções de todo tipo, como o foram no passado.
Os saldos não aplicados retornarão ao Tesouro Nacional.
Por fim, anote-se que a competência para a coordenação trans-setorial das ações já fora deferida às velhas Sudene e Sudam, mas fracassou por motivos notórios. E a Sudene original era até vinculada diretamente à Presidência da República, para ter força.
Certo: permanecem o FNO e o FDA, este com as novas restrições.
Mas seguir-se-á dizendo, para fins cerimoniais, que o art. 43 da Constituição foi finalmente cumprido com a sanção – embora deficiente, porque acoplada a veto parcial -- das Leis Complementares geminadas de nos. 124 e 125.
Acredite quem quiser.
Brasília, 12 de janeiro de 2007
391º aniversário da Fundação da Cidade de Santa Maria de Belém do Grão-Pará
1 As leis e os vetos podem ser baixados facilmente do site da Presidência da República: www.presidencia.gov.br Legislação – Leis Complementares.
2 Ressalvas a levar em conta: 1. Este não pretende ser o início de uma discussão em tese sobre conceitos, preceitos e pleitos de desenvolvimento regional. 2. É só um comentário inicial que considera as LCs 124 e 125 tal como aprovadas pelo Congresso como dados não perfeitos, é certo, entretanto perfectíveis, a serem bem manejados para alcançar os seus propósitos. 3. Os vetos perturbam, se não impedem, a efetivação das boas intenções das Leis. 4. Esta Nota pode ser entendida como o sumário executivo de artigo mais elaborado a sair na imprensa de Belém nos próximos dias.

Comentários

Prezado Amigo Alencar,
só nos últimos dias tomei conhecimento da existência do seu blog, que acabo de agregar aos meus "Favoritos".
Agradeço as referências generosas com que me brindou na abertura da publicação do artigo sobre a nova Sudam.
Entretanto, como nele deixei claro, tratava-se de sumário de artigo bem maior, mais completo, que, embora aceito para publicação, encalhou há semanas na mesa da chefia de redação de jornal de largo alcance.
Para terminar, registro com pesar mas sem surpresa, que o meu convite ao debate da matéria contido no texto divulgado no seu blog, não mereceu até agora nenhum comentário. Cívica pasmaceira.
Experimente, no entanto,falar sobre os edredons do BBB-007 e seus frequentadores, e com certeza choverão comentários. Cínica bagaceira.
Sucesso.
Grande abraço.
ADM

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