Notícias da Guatemala: Lago Atitlán

Depois de uma imersao de tres horas na mais pura cultura quiché e comprar roupas maias incrívelmente bonitas e bem feitas, fui para o Lago Atitlán, passando por Panajachel (conhecida como Gringotenango, onde almocei) e pernoitando em Santa Catarina Palopó (junco), em um simpático hotel da cadeia Villas de Guatemala. O lago estava escondido pelas brumas vespertinas. De manha cedo atravessei o lago em forma de morcego - certo que é preciso muita boa vontade para perceber essa forma no mapa - e fui visitar Santiago Atitlán. As brumas nao permitiam ver bem os vulcoes que rodeiam o lago. O lago é, na verdade, uma imensa cratera (21 km X 13 km) que encheu de água, que agora está escapando por um desaguadeiro subterraneo. A tranquilidade do lago esconde a fúria da terra e de seus vulcoes, de assustadora e fascinante beleza, mesmo encobertos pelas brumas, que lhes emprestavam um ar misterioso e mágico. Era dia de feira, menor que a de Chichicastenango. As roupas aqui mudam. Os huipiles e os cortes (saias) tem cor predominante azul turquesa, a cor do lago. As mulheres usam um impressionante turbante, na verdade uma faixa de uns oito centímetros de largura por vinte metros de comprimento cuidadosamente enrolado, em pouco mais de um minuto. Na Igreja de Santiago criancas apresentavam na escadaria cancoes em homenagem para as maes (seu dia seria no dia seguinte). Uma monja de huipile (blusa) e corte (vestido) maia parecia a diretora espiritual do grupo.
Dentro da Igreja, a primeira surpresa: os santos estavam vestidos com mantos feitos de tecidos com motivos maias. É que para cada época do ano as cofradias - irmandades - vestem os santos de uma cor diferente. Sao quatro, as quatro cores básicas dos maias, que simbolizam os quatro pontos cardeais e as quatro divindades que suportam o céu nas esquinas de uma Terra plana.
No retábulo central, mais surpresas: deuses maias e referencias explícitas a deidades e símbolos maias convivem tranquilamente com os santos católicos. O Santiago daqui é o Peregrino, com seu chapéu e a concha (as duas outras representacoes dele sao o Apostolo e o Guerreiro).
Na feira disputavam cada pedaco de rua roupas, tecidos, frutas e verduras. Tinha camarao e peixe seco de todos os tamanhos, inclusive um cascudo parecido com tamuatá. O camarao seco é igual ao nosso. Muricis gigantes, pessegos, morangos e chiles fazem a festa dos olhos e narizes.
Um templo evangélico bota gente pelo ladrao e um pregador inferniza todos com um megafone, anunciando a chegada do fim do mundo (programada para 2012, conforme a tradicao maia). Esgueiramo-nos entre vendedores e fiéis para visitar um templo bem diferente, o de Maximón, o malvado santo - resultante do sincretismo maia com o catolicismo - que dizem ser Sao Simao. Ele gosta de fumar charutos e na sua imagem sempre tem um aceso. Uma senhora bem doente recebia as intercessoes de um sacerdote maia - vestido a moda ianque - intercalando o espanhol e seu próprio dialeto maia. Oferendas florais, velas e aguardente se misturavam com propaganda de cerveja e um cachorro dorminhoco. Quem quer fazer foto, paga. Preferimos respeitar o ritual e nao fazer foto alguma.
Na volta para o barco, um mergulho final no mercado e nas roupas maias levou-me a comprar mais um huipile, depois de regatear até o último quetzal: tive que entregar todos, para ficar com o huipile que queria. A habilidade das mulheres maias para o comércio é ancestral. O regateio é ritual imprescindível, mas só se consegue chegar no exato valor que elas querem, nem um quetzal a menos. Mesmo assim, as prendas sao de boa qualidade e bom preco (nesse caso, mais ou menos trinta reais por um belo huipile e uma aula de como fazer para dar o acabamento com linha e agulha). Valeu cada quetzal.
Atravessei o lago de volta, passei por Panajachel outra vez e fui para Antigua, onde contratei uma subida ao vulcao Pacaya para o dia seguinte. Na verdade contratamos, pois estou na companhia de dois jovens casais espanhóis e mais a cunhada de um deles, gente muito simpática e divertida.
No restaurante do Hotel Posada Don Rodrigo fui de chiles rellenos, o prato típico antigueño. Gostei. Mas gostei mais do chiles en nogada mexicano. Valeu a pena pelo espetáculo, a danca típica da regiao, com as danzantes usando máscaras de madeira (que Frida e Diego colecionavam e sao vendidas nos mercados). E um verdadeiro show de marimbas (duas, tocadas por oito músicos).
Antigua parece com Trinidad (de Cuba) e San Miguel de Allende (México), mas o teremoto que fez a capital ser transferida para Guatemala faz toda a diferenca.
De noite Antigua é simplesmente encantadora, misteriosa e mágica. Nela parece que voltamos aos tempos coloniais.
É um lugar para voltar.

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