Requiem Para Bené

O Senador José Nery cometeu a gentileza de remeter para o poster este belo

Requiem para Benedito Monteiro



Senhor presidente,

Senhoras senadora,

Senhores senadores,





Ocupo esta tribuna para fazer uma homenagem a um ilustre brasileiro que sai do nosso convívio para compor o encantamento do universo.

O tempo é de réquiem (da expressão em latim requiem aeternam dona eis - “dai-lhes o repouso eterno”), porque no último 15 de junho, o Pará e o Brasil perderam Benedito Monteiro, o Bené dos paraenses.

Paradoxalmente, é também momento de celebração da vida que se imortaliza em sua obra e exemplo.Benedito Monteiro buscou a plenitude do seu tempo, fazendo escolhas que o tornaram um homem ímpar frente às circunstâncias desafiadoras, sempre se postando em defesa do povo.

Para repassá-lo ao Brasil, recorro às palavras do jornalista Mário Drumond (revista Caros Amigos, nov/2006) que assim o descreveu: “Homem do povo, getulista histórico, amigo de Jango, Brizola e Ribeiro, deputado estadual do Pará, cassado, caçado e preso em 1964, anistiado e eleito duas vezes deputado federal, procurador-geral e secretário de Estado do Pará, o escritor nascido e criado às margens do Amazonas, renovou a literatura, a poesia, a música e a filosofia de seu povo. Autor de romances, poemas, músicas e muitos livros publicados, entre os quais a sua tetralogia amazônica que imortaliza o personagem Miguel, o mestiço que a pena de Benedito fez ícone da nacionalidade, elevando-o à galeria maior da nossa representação literária, onde já figuram o sertanejo de Euclides da Cunha, o jeca de Monteiro Lobato e o gaúcho cantado nos ditirambos dos pampas”.

Benedito Wilfredo Monteiro nasceu em Alenquer-Pará, em 1º de março de 1924, tranferindo-se mais tarde para Belém, onde diplomou-se como bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito.

Foi eleito deputado estadual para dois mandatos. Em 1964, já em seu segundo mandato, sob alegação de subversão, foi cassado, preso, torturado, marginalizado e teve seus direitos políticos suspensos por 10 anos. Quando saiu da prisão, dedicou-se ao exercício da advocacia agrária e à literatura, tendo publicado o livro intitulado Direito Agrário e Processo Fundiário.

Com a redemocratização do País, elegeu-se deputado federal em 1982 e reelegeu-se para a Assembléia Nacional Constituinte.

Em várias ocasiões demonstrou seu inconformismo com o fato de a Amazônia ser vista pelas elites nacionais e mundiais, apenas como um depósito de riquezas estratégicas, exemplificando que todo ferro de Carajás é exportado e que o alumínio produzido no Pará é dos japoneses. Afirmava também, que a única solução possível para o Brasil, começaria por uma reforma agrária.

Certa feita afirmou: “Quando escrevo faço o exercício da minha mais íntima liberdade”. Ao sair da prisão em 1964, pretendia escrever um grande romance sobre a Amazônia e o povo amazônida. Dessa vontade, surgiu a Tetralogia Amazônia: Verde Vagomundo, o Minossauro, A Terceira Margem e Aquele Um; além dos livros Carro dos Milagres, Cancioneiro do Dalcídio, Como se faz um Guerrilheiro, Maria de Todos os Rios e outros, todos publicados por editoras do Rio de Janeiro e São Paulo. Seus livros têm sido objeto de estudos nas universidades brasileiras, e ainda em universidades da França e Alemanha. Recentemente “Maria de Todos os Rios”, foi publicado na Holanda.



Senhoras e senhores senadores,

Faço esta homenagem até como um desagravo ao meu Estado e à Amazônia, tão castigados pelas mazelas impostas por um sistema político e econômico que privilegia sempre interesses alheios às necessidades mais sentidas de seu povo. Refiro-me ao modelo de desenvolvimento predatório imposto historicamente à Amazônia que está na raiz dos graves desequilíbrios sócio-ambientais que nosso país atravessa.

Não é por menos que sempre atualizo a crítica aos planos governamentais para a Amazônia, neste momento o PAC, porque no cerne, não descartam o aprofundamento da devastação e da miséria social, traduzidos em devastação de florestas, saque de riquezas naturais, prejuízos irreparáveis para os povos indígenas, comunidades tradicionais e maiorias urbanas.

Para finalizar esta homenagem a um amazônida abnegado que acreditava em seu povo, transcrevo as palavras de seu personagem-ícone, Miguel, em Verde Vagomundo, por que através de sua obra ficcional, Bené fazia um manifesto ecológico, ao tratar o homem como parte da natureza e não como perigo para essa mesma natureza : “ Nego as mortes e renego as mortes, todas as mortes. As mortes de ficar calado, as mortes de ver a água correr, as mortes de ver o rio sempre passar, as mortes gerais dos homens que envelhecem. E nego e renego as mortes. Eu só afirmo a vida. As minhas afirmativas, só são de bem-querer, de bem-viver e de bem-lutar (...)”.





Plenário do Senado Federal, 17 de junho de 2008



Senador JOSÉ NERY

PSOL - PA




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