A Sentença do Pai de Santo (2)
O colega Juiz do Trabalho Carlos Zahlouth fez um interessante comentário sobre o tema, que resolvi transformar em post, para incentivar o debate.
Mas antes recomendo ler também os comentários do Juliann, do Lafayette (que de tão entusiasmado pelo tema soube da sentença antes de mim) e da Cris (que de tão animada pode trocar o jornalismo pelo direito, no que tem meu incentivo).
Segue o comentário do colega Zahlouth.
Mas antes recomendo ler também os comentários do Juliann, do Lafayette (que de tão entusiasmado pelo tema soube da sentença antes de mim) e da Cris (que de tão animada pode trocar o jornalismo pelo direito, no que tem meu incentivo).
Segue o comentário do colega Zahlouth.
Esse tema é muito interessante, confesso que no dia-a-dia tenho encontrado dificuldades para definir a competência da justiça do trabalho, diante do que se entende por relação de trabalho.
No caso posto a debate, a Constituição Federal consagra em seu texto a liberdade religiosa a todo cidadão brasileiro (artigo 5º, inciso VI: É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurada aos locais de culto e as suas liturgias).
O inciso VIII reforça tal posição, quando proclama que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.
Portanto, expressamente está incluído o direito de ser escolher a religião que deseja, mais ainda, o de expressar as tradições e ritos da crença escolhida.
Neste sentido, cada religião tem seus ritos, no caso da umbanda, é comum o oferecimento de “agrados” aos seus “santos”, consistindo em trabalhos de limpeza espiritual, velas, comidas, bebidas e outros instrumentos de conexão da matéria com o espírito.
Portanto, não se trata de uma relação de trabalho, pois a origem de tal ligação parte da fé, do dogma, da devoção e da crença.
Tenho entendido que a relação de trabalho tem objeto não numa prestação e uma correspondente contraprestação, mas sim numa colaboração econômico-social entre os membros da comunidade.
Por este prisma, penso ser impossível se reconhecer a relação fiel-religioso, como elemento da relação de trabalho.
O amigo juiz Jorge Luiz Souto Maior no que diz respeito ao tema (relação de trabalho), aponta que existe uma corrente ampliativa, a expressão deveria ser lida em função do sentido comum da expressão trabalho que em algum dicionário qualquer poderia ser vista como “aplicação da atividade humana a qualquer exercício de caráter físico ou intelectual”.
Já para a restritiva, o Direito do Trabalho foi criado para gerar um tipo de proteção especial a quem presta serviços, submetido a uma relação de poder. A linguagem comum, não se debruça sobre aqueles traços que o direito material assume como pressupostos para definir trabalho (pessoalidade, continuidade, onerosidade, subordinação) e, por conseqüência, a expressão deveria ser lida como relação de trabalho subordinado.
O trabalhador é a parte que assume a obrigação contratual de ceder os resultados de seu trabalho à outra parte.
Implica na cessão do próprio trabalho e como, na medida em que o trabalho é uma emanação da própria pessoa do trabalhador, esta fica envolvida e comprometida na prestação. Sendo tal cessão onerosa, o trabalhador adquire contratualmente o direito a uma contraprestação da outra parte, como paga ou retribuição de seu trabalho.
Logo, o pai de santo, o pastor, o padre, o rabino, são elementos de ligação entre o crente e o sagrado.
Assim, com a devida vênia da colega prolatora da decisão, resta evidenciada a impossibilidade de se estabelecer como relação de trabalho, os encaminhamentos espirituais feitos pelo pai de santo a uma fiel.