Administração do tempo é assunto de tribunais?

A pergunta e as respostas são de   Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF 4.ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR. Foram publicadas na revista Consultor Jurídico.

Administração do tempo é assunto de tribunais?
Vladimir Passos de Freitas
O Direito sempre teve os seus ícones. Carvalho Santos Pontes de Miranda e outros tantos, tinham suas afirmações repetidas e adotadas sem discussão.

O passar dos anos transformou as grandes obras em livros condensados em um só volume com muita jurisprudência. Em uma terceira fase as obras mais procuradas passaram a ter pequeno volume e destinar-se, via de regra, a concursos.

Os profissionais do Direito tinham prazer em comprar e exibir os seus livros em suas bibliotecas. Muitos nem eram lidos. Mas exteriorizavam cultura jurídica. Em futuro breve, as obras serão todas eletrônicas e bibliotecas serão uma curiosidade para os jovens.

Por dezenas de anos os conhecimentos paralelos ao Direito foram solenemente desprezados. Um advogado, que em regra tinha apenas um ou dois empregados na administração, não se preocupava com a gerência do escritório ou marketing.

Um juiz não tinha a menor ideia ou interesse na administração de sua Vara ou Tribunal. E um promotor não se preocupava com o assunto simplesmente porque não tinha nada e ninguém. Fui promotor de 1970 a 1980, usava minha máquina de escrever Olímpia e quando tinha que mandar um ofício ao procurador geral datilografava, selava e ia postar o envelope no correio.

O mundo mudou. Telefone celular, internet rompendo fronteiras e processos eletrônicos. Estas comodidades não facilitaram nossas vidas. Ao contrário, tornaram-nas mais complexas. As 24 horas não cabem no dia de um operador do Direito.

Pois bem, se o tempo ficou curto, era de presumir-se que seria melhor aproveitado. Na rotina dos bons escritórios de advocacia já é assim. Alguns cobram a consulta por minutos. Mas no mundo do Judiciário raramente alguém se preocupa com isto.

O tempo é um bem precioso. No distante ano de 1987 matriculei-me em um curso de administração de tempo. Durante três dias aprendi a gerir o fluxo dos papeis, a economizar tempo e racionalizar serviços. Apliquei as lições na 5.ª Vara Federal de Curitiba, onde os processos tinham sentença, regra geral, em quatro meses.

Onde e como administrar o tempo no Judiciário, de modo a abreviar as decisões e ter mais tempo para ouras coisas da vida? Não há uma resposta única. Mas algumas medidas podem ser tomadas. Vejamos, com foco exclusivo nos Tribunais.

Um julgamento do Pleno de um Tribunal pode ter a participação de 25 desembargadores. Tem sentido um divergente e vencido voto durar 45 ou 60 minutos? Quanto se gasta em dinheiro mantendo tantas pessoas, incluindo servidores, por uma hora? Faça-se o cálculo pelos vencimentos dos envolvidos e veja-se quão dispendioso pode ser um voto inútil.

Uma Câmara (ou Turma) julga e a secretaria publica depois o acórdão no DJ. Isto pode ser feito eletronicamente de forma direta, uma via vai direto ao DJ. Quanto tempo e trabalho se economiza com uma medida simples como esta?

O voto pode ser disponibilizado previamente aos membros da Câmara ou Turma e estes destacarem aqueles nos quais discordam. No dia do julgamento só estes entram em discussão. Tem sentido proceder-se como antes, cada relator lendo relatório e voto? Isto deve ficar restrito a casos de divergência ou sustentação oral.

O relator emite seu voto e os demais julgadores concordam. Tem sentido alguém ficar justificando longo tempo a mesma conclusão? Para quê?
O caso a ser julgado é de matéria totalmente pacificada pela jurisprudência (fato comum nos TRFs). É razoável o advogado fazer sustentação oral, sabendo de antemão que se sairá vencedor?

Tribunais exercem a administração da Justiça. Decidem remoções, promoções, férias, licenças, vantagens pecuniárias, processos disciplinares e outros assuntos de juízes e servidores. Tem sentido a cada caso perder-se tempo com longa análise e voto? Não é mais simples fazer súmulas administrativas para as situações mais usuais? Não fica mais transparente e seguro?

Nos congressos ou seminários, será tão difícil começar e terminar na hora marcada? Será necessário cada um que se apresenta saudar um a um que se acha no evento? Esta perda de tempo tem justificativa em 2010?

Podendo enviar cartas de ordem (ou precatórias) eletrônicas, faz sentido mandá-las impressas? Quanto tempo se perde imprimindo, pondo no envelope e levando ao correio? Ademais, se vários Juízos dispõem de vídeo-conferência, será preciso deprecar? O desembargador (ou juiz do processo) não pode ouvir alguém no Fórum de outra cidade?

Os processos em que intervêm órgãos públicos (v.g. MPF, INSS e PFN) vão e voltam diariamente em veículos, com perda de tempo (carga, assinaturas, etc.) e despesas (pessoal e combustível). Será tão difícil alguém tomar ciência na secretaria e pedir que remetam-se apenas os casos que exigem exame mais profundo? Isto diminui a pessoa? A instituição?

Os processos agora são eletrônicos. Só que para abri-los é preciso clicar em cada item. Então, examina-se a inicial, mas é necessário abrir outros itens que correspondem a documentos ou decisões. Na dá para fazer como os modernos livros eletrônicos, cujas páginas viram? Quanto tempo se perde clicando aqui e ali? Quem paga?

Tem sentido um voto divergente que, teimosamente, se opõe à jurisprudência consolidada do STF ou STJ? Não é mais fácil aderir à tese vencedora, ainda que justificando a posição? Quanto tempo e dinheiro se gastará pelo capricho da divergência inconsequente, à espera de definição em embargos infringentes?

Em suma, muitos são os atos que estão a merecer revisão de postura. Administrar bem o tempo significa mais eficiência, menos despesas, melhor atendimento ao consumidor (público) e possibilidade de aproveitar melhor o dia. É assunto a ser introduzido nos Tribunais, não é matéria de Direito mas é essencial à efetividade da Justiça. Mãos à obra.
Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF 4.ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR. Artigo publicado na Revista Consultor Jurídico.

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