notícias do Caminho - de Los Arcos a Logroño
Dia 23 de abril de 2010, sexta-feira, pouco depois das sete da manha deixamos Los Arcos, cidade que sempre me deixa boa impressao, pela Iglesia de Santa Maria e seu belo claustro, com sua impressionante torre renascentista. Agora tenho mais uma boa lembrança para levar: seu centro cultural, com biblioteca, internet e um jardim de esculturas modernas dialogando com a igreja do outro lado do rio. O jantar no La Gargantua também já é uma boa lembrança (salada ou lentilha de entrada, bacalhau a romana de prato principal, pao, vinho e água, por 12 euros, gorjeta incluída).
A quantidade de peregrinos que se avista sinaliza que o Ano Jacobeo começa a encher o Caminho. A caminho de Sansol contei mais de vinte só olhando rapidamente para diante e para trás. Em Sansol esperei meus amigos em um bar anunciado em um cartaz abaixo de uma marca registrada: Cafés Brasilia. O símbolo é uma mulata que lembra muito Carmen Miranda.
Menos de um quilômetro depois reencontro a Igreja do Santo Sepulcro de Torres del Rio, uma das minhas preferidas do Caminho. Passei aqui em 2007 com Araceli, que fez suas oraçoes matutinas nesta igrejinha octogonal inspirada no Templo de Jerusalém. Fico impressionado com o rendilhado de pedra das lanternas. Nesta igrejinha há o sincretismo do que tem de melhor na engenharia crista com o que há de melhor na engenharia muçulmana. O efeito é deslumbrante. Ela lembra muito a de Santa Maria de Eunate.
Partimos para Viana. No Caminho topo com um trator e uns quatro automóveis. Seus proprietários sao os trabalhadores de um vinhedo que está sendo preparado. Tem muitos vinhedos sendo renovados por aqui. E alguns já foram renovados, pois as parreiras estao fininhas. As parreiras erradicadas formam montes de lenha para o próximo inverno (dizem que é a melhor lenha para lareira). Nos bares estao servindo a safra de 2008, vinhos jovens e agradáveis.
Mas o que quero mesmo é chegar a Viana, a encantadora cidade de Cesar Bórgia. Na entrada encontro um peregrino madrilenho com seu golden retriever Jan, que peregrinam até Santiago. Jan carrega sua raçao em duas pequenas mochilas encangalhadas e nao faz feio. Seu dono inspeciona as patas dele e artem alegremente para Logroño.
Em 2007 passei aqui exatamente na semana em que se celebrava o quinto centenário da morte do fascinante César Bórgia, cardeal, príncipe, guerreiro, libertino e - se nao fosse pouco - filho de Papa (Alexandre VI). Um típico homem do Renascimento. Ele chegou aqui em 1506, fugindo da prisao em Nápoles. O estrépito de sua passagem por aqui - tao perto do Caminho e tao longe do Vaticano... - faz-se ouvir até hoje. Ele está sepultado na Iglesia de Santa Maria, em frente da qual fica o Ayuntamiento, um edifício barroco impressionante. Do quinto centenário de sua morte sobrou um cartaz em uma arcada na entrada do centro histórico. Cesar Bórgia é o personagem histórico mais conhecido de Viana e exemplo bem marcado dessa algaravia cultural que fez do Caminho de Santiago um Itinerário Cultural Europeu por excelência. Nesta cidade medieval cercada de conjuntos habitacionais modernos - a bolha imobiliária daqui nao era só de papel... - a vontade é ficar, mas prefiro passear e acompanhar um grupo de turistas com uma guia e seu megafone. Eles me olham com curiosidade e pedem para fazer fotos. Senhoras e senhores muito simpáticos que vao passar o dia zanzando por aqui e deixando seus euros nesta cidadezinha encantadora e com nome português. Temos muito, mas muito que aprender com os espanhóis em matéria de turismo, religioso inclusive.
Reencontro meus amigos na sidreria Armendáriz, onde resolvemos almoçar. Peço sortido de fritos, chuleta com batatas fritas, pao, vinho tinto (Homenaje, uma denominaçao de origem controlada da Navarra, feito com uvas Tempranillo e Cabernet Sauvignon da safra de 2008 que caiu bem) e pera cozida no vinho, a 12 euros, com gorjeta. Boa relaçao custo/beneficio. É final de dia e marcamos reencontro em Logroño, no albergue municipal.
No caminho vou encontrando cartazes convidando para uma manifestaçao de viticultores em Logroño (Queremos vivir de las uvas!). Saio de Viana por um dos novos conjuntos habitacionais de classe média. O Caminho agora está atapetado de painas que voam como se fossem flocos neve ou plumas de samaúma.
Por volta das seis da tarde cruzo a divisa de Navarra com Rioja e agora estou definitivamente na terra do bom vinho.
Decido nao seguir a variante pelo Observatório de Aves e apresso o passo na trilha que margeia a rodovia barulhenta - pelo menos para os sensíveis ouvidos de um peregrino - atravesso o distrito industrial e perto das sete da noite passo pela casa da Senhora Felisa, cuja filha continua carimbando credenciais e dando informaçoes aos peregrinos. Na frente da casa encontro uma talha sobre o Caminho do Sol, no Brasil. Encantadora Felisa, personagem emblemático do Caminho, que deixou de herança essa missao para sua filha. Logo entro em Logroño por um belo passeio ladeado de ciprestes. Atravesso a velha ponte de pedra quando o sol já se aproxima do horizonte e vou reencontrando os peregrinos. Chego no albergue municipal e os dois últimos lugares foram ocupados naquele instante. Solícita, a hospitalera me indica o albergue particular Puerta de Revellin, da Blanca, e me dá o mapa. Dez minutos mais de caminhada e chego ao albergue, instalado no térreo de um edifìcio novo, construído em torno da antiga Plaza de Toro - a nova, modernosa e coberta, multiuso, fica a esquerda de quem chega pela ponte - e é muito agradável e limpo (Plaza Martinez Flamarique, 4 bajo). Blanca me atende a pede que eu escolha logo as camas e depois volte para carimbar a credencial e pagar (10 euros), no melhor espírito destes albergues que batem com nosso santo. Aviso por telefone meus amigos e vou ao supermercado comprar o lanche e o café da manha seguinte.
Desta vez nao tive tempo de passear na cidade, que é a capital da regiao. Mas amanha cedo vou percorrer a Rua Vieja - onde fica o excelente albergue municipal - e rever a fonte barroca dos peregrinos. Por enquanto me contento em avistar as torres da Iglesia de Santa Maria del Palacio e da catedral de Santa Maria la Redonda.
Às dez e meia da noite Blanca apaga a luz e vamos dormir para amanha encarar o estirao de 30 km até Nájera, se as pernas de minha amiga aguentarem o tranco.
A quantidade de peregrinos que se avista sinaliza que o Ano Jacobeo começa a encher o Caminho. A caminho de Sansol contei mais de vinte só olhando rapidamente para diante e para trás. Em Sansol esperei meus amigos em um bar anunciado em um cartaz abaixo de uma marca registrada: Cafés Brasilia. O símbolo é uma mulata que lembra muito Carmen Miranda.
Menos de um quilômetro depois reencontro a Igreja do Santo Sepulcro de Torres del Rio, uma das minhas preferidas do Caminho. Passei aqui em 2007 com Araceli, que fez suas oraçoes matutinas nesta igrejinha octogonal inspirada no Templo de Jerusalém. Fico impressionado com o rendilhado de pedra das lanternas. Nesta igrejinha há o sincretismo do que tem de melhor na engenharia crista com o que há de melhor na engenharia muçulmana. O efeito é deslumbrante. Ela lembra muito a de Santa Maria de Eunate.
Partimos para Viana. No Caminho topo com um trator e uns quatro automóveis. Seus proprietários sao os trabalhadores de um vinhedo que está sendo preparado. Tem muitos vinhedos sendo renovados por aqui. E alguns já foram renovados, pois as parreiras estao fininhas. As parreiras erradicadas formam montes de lenha para o próximo inverno (dizem que é a melhor lenha para lareira). Nos bares estao servindo a safra de 2008, vinhos jovens e agradáveis.
Mas o que quero mesmo é chegar a Viana, a encantadora cidade de Cesar Bórgia. Na entrada encontro um peregrino madrilenho com seu golden retriever Jan, que peregrinam até Santiago. Jan carrega sua raçao em duas pequenas mochilas encangalhadas e nao faz feio. Seu dono inspeciona as patas dele e artem alegremente para Logroño.
Em 2007 passei aqui exatamente na semana em que se celebrava o quinto centenário da morte do fascinante César Bórgia, cardeal, príncipe, guerreiro, libertino e - se nao fosse pouco - filho de Papa (Alexandre VI). Um típico homem do Renascimento. Ele chegou aqui em 1506, fugindo da prisao em Nápoles. O estrépito de sua passagem por aqui - tao perto do Caminho e tao longe do Vaticano... - faz-se ouvir até hoje. Ele está sepultado na Iglesia de Santa Maria, em frente da qual fica o Ayuntamiento, um edifício barroco impressionante. Do quinto centenário de sua morte sobrou um cartaz em uma arcada na entrada do centro histórico. Cesar Bórgia é o personagem histórico mais conhecido de Viana e exemplo bem marcado dessa algaravia cultural que fez do Caminho de Santiago um Itinerário Cultural Europeu por excelência. Nesta cidade medieval cercada de conjuntos habitacionais modernos - a bolha imobiliária daqui nao era só de papel... - a vontade é ficar, mas prefiro passear e acompanhar um grupo de turistas com uma guia e seu megafone. Eles me olham com curiosidade e pedem para fazer fotos. Senhoras e senhores muito simpáticos que vao passar o dia zanzando por aqui e deixando seus euros nesta cidadezinha encantadora e com nome português. Temos muito, mas muito que aprender com os espanhóis em matéria de turismo, religioso inclusive.
Reencontro meus amigos na sidreria Armendáriz, onde resolvemos almoçar. Peço sortido de fritos, chuleta com batatas fritas, pao, vinho tinto (Homenaje, uma denominaçao de origem controlada da Navarra, feito com uvas Tempranillo e Cabernet Sauvignon da safra de 2008 que caiu bem) e pera cozida no vinho, a 12 euros, com gorjeta. Boa relaçao custo/beneficio. É final de dia e marcamos reencontro em Logroño, no albergue municipal.
No caminho vou encontrando cartazes convidando para uma manifestaçao de viticultores em Logroño (Queremos vivir de las uvas!). Saio de Viana por um dos novos conjuntos habitacionais de classe média. O Caminho agora está atapetado de painas que voam como se fossem flocos neve ou plumas de samaúma.
Por volta das seis da tarde cruzo a divisa de Navarra com Rioja e agora estou definitivamente na terra do bom vinho.
Decido nao seguir a variante pelo Observatório de Aves e apresso o passo na trilha que margeia a rodovia barulhenta - pelo menos para os sensíveis ouvidos de um peregrino - atravesso o distrito industrial e perto das sete da noite passo pela casa da Senhora Felisa, cuja filha continua carimbando credenciais e dando informaçoes aos peregrinos. Na frente da casa encontro uma talha sobre o Caminho do Sol, no Brasil. Encantadora Felisa, personagem emblemático do Caminho, que deixou de herança essa missao para sua filha. Logo entro em Logroño por um belo passeio ladeado de ciprestes. Atravesso a velha ponte de pedra quando o sol já se aproxima do horizonte e vou reencontrando os peregrinos. Chego no albergue municipal e os dois últimos lugares foram ocupados naquele instante. Solícita, a hospitalera me indica o albergue particular Puerta de Revellin, da Blanca, e me dá o mapa. Dez minutos mais de caminhada e chego ao albergue, instalado no térreo de um edifìcio novo, construído em torno da antiga Plaza de Toro - a nova, modernosa e coberta, multiuso, fica a esquerda de quem chega pela ponte - e é muito agradável e limpo (Plaza Martinez Flamarique, 4 bajo). Blanca me atende a pede que eu escolha logo as camas e depois volte para carimbar a credencial e pagar (10 euros), no melhor espírito destes albergues que batem com nosso santo. Aviso por telefone meus amigos e vou ao supermercado comprar o lanche e o café da manha seguinte.
Desta vez nao tive tempo de passear na cidade, que é a capital da regiao. Mas amanha cedo vou percorrer a Rua Vieja - onde fica o excelente albergue municipal - e rever a fonte barroca dos peregrinos. Por enquanto me contento em avistar as torres da Iglesia de Santa Maria del Palacio e da catedral de Santa Maria la Redonda.
Às dez e meia da noite Blanca apaga a luz e vamos dormir para amanha encarar o estirao de 30 km até Nájera, se as pernas de minha amiga aguentarem o tranco.
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