Andorinha (2)

Reproduzo post de Octavio Pessoa publicado no blog dele, cuja leitura e seguimento eu recomendo.


UM REGUFFE SÓ NÃO FAZ VERÃO

                                                                                                                                                                                                                Octavio Pessoa 

            Se “Uma andorinha só não faz verão”, um Reguffe só também terá dificuldade de fazê-lo.  Quem é ANTONIO José Machado REGUFFE?

            É um jornalista e economista nascido no Rio de Janeiro e criado em Brasília que se elegeu deputado federal pelo Distrito Federal, nas últimas eleições, com uma votação proporcionalmente considerada, maior que o palhaço Tiririca. Sim, o eleitorado de Brasília é muito menor que o do estado de São Paulo. De cada cinco votos dos brasilienses, um foi para Reguffe. Ele obteve duzentos e sessenta e seis mil e quatrocentos e sessenta e cinco votos, o equivalente a quase dezenove por cento do eleitorado do Distrito Federal.

            Qual o segredo para essa façanha?  A coerência entre o discurso e a prática, durante seu mandato de deputado distrital, conquistado em 2006. Deputado distrital é o equivalente, no Distrito Federal, aos deputados estaduais, nos estados.

Ou seja, o deputado Reguffe está concluindo seu primeiro mandato de deputado distrital e no próximo ano, assumirá uma cadeira na Câmara dos Deputados. O que Regufffe se propôs a fazer e o fez, nos quase quatro anos, na Câmara Legislativa de Brasília? 

       Primeiro, abriu mão dos décimo quarto e do décimo quinto salários, prerrogativa dos deputados, para igualar-se a todos os trabalhadores que ganham apenas treze salários; eliminou 14 vagas de assessores e diminuiu a ajuda de custo de seu gabinete. Com isso, economizou aos cofres públicos mais de R$ 53 mil por mês, num total de R$ 3 milhões, nos quatro anos de mandato. Dinheiro que poderia ser empregado em educação, saúde, segurança pública, e não, por exemplo, para os deputados distritais terem assessores em excesso. 

       Com desprendimento sincero, Reguffe não é nenhum milionário, o deputado ficou à vontade para aprovar projetos de lei sintonizados com os interesses da cidadania e de rejeitar aqueles que não consultam os interesses públicos, independentemente de terem sido apresentados pelo governo ou pela oposição. 

        E graças a essa rara independência, viu serem aprovados projetos de lei de sua autoria como o que concede bônus-desconto de 20%, ao consumidor que reduz seu consumo de água, tomando como base o consumo do mês do ano anterior. Projeto esse, que está sendo copiado por várias assembléias legislativas, em todo Brasil. Aprovou também, o que incentiva o uso de bicicleta, obrigando a instalação de bicicletários nos centros comerciais e bancos. O parlamentar formulou ainda, várias denúncias, exercendo efetivamente o papel de fiscal da aplicação dos recursos públicos, que todo parlamentar deveria exercer. 

            Nas últimas eleições, Reguffe votou no primeiro turno em Marina Silva. No segundo, não apoiou nem Serra nem Dilma, por não se sentir representado seja pelo PT ou pelo PSDB, sendo o partido a que é filiado, o Partido Democrático Trabalhista- PDT, da base de sustentação do governo federal, para onde foi levado por Cristóvam Buarque.
Nas eleições de Brasília, Reguffe apoiou Agnelo Queiroz para o governo. Fez isso porque considera que Roriz já governou a cidade por 14 anos e já demonstrou sobejamente a que ele veio. E Agnelo representa um novo caminho, outra alternativa para Brasília, apesar de, pelo gosto de Reguffe, Brasília merecer algo diferente do PT e de Roriz.
A fórmula é essa. Coerência entre a ação e discurso de campanha. No exercício de seu mandato de deputado distrital, Reguffe foi coerente com seu discurso, o que explica seu sucesso na disputa à Câmara dos Deputados.

          Para o novo deputado federal, a discussão de uma reforma política, no Congresso Nacional, é urgente e necessária. “Este país precisa de uma reforma política profunda e urgente. As pessoas hoje não se consideram representadas pela classe política e há um poço que separa representantes de representados. Nós vivemos em um Estado Democrático de direito, mas não vivemos em um Estado Democrático de fato. Há uma crise na nossa democracia representativa que é culpa dos personagens, dos desvios éticos inaceitáveis, e também, culpa do sistema”, diz o deputado que resume sua proposta em cinco pontos.  
O primeiro é o fim da reeleição para cargos executivos e a proibição de mais de uma única reeleição para cargos legislativos. É preciso oxigenar a política constantemente, quebrar vícios e renovar a política de uma forma constante, afirma ele. 

            Segundo, a instituição do voto facultativo no Brasil, vale dizer, e o fim do voto obrigatório. O resultado do voto obrigatório, para Reguffe, é o Tiririca. Com o voto facultativo, os Tiriricas não seriam eleitos. Além do que, como é sabido, o voto obrigatório dá margem a todo tipo de influência do poder econômico. É preciso trazer mais consciência ao gesto de votar.

            Terceiro, o voto distrital. Para Reguffe, hoje há uma distância enorme entre representantes e representados, “e precisamos diminuir esta distância. A política tem de se tornar mais acessível”. 

       Voto distrital é aquele em que a circunscrição eleitoral é dividida em diversos distritos e o parlamentar representa os interesses de determinado distrito, tornando-se mais fácil o controle da ação parlamentar por seus eleitores. Trata-se de um sistema presente em diversos países europeus e no Chile.
       Neste ponto, referindo-se às campanhas em Brasília, diz o parlamentar, “os candidatos têm de fazer campanha no Distrito Federal todo, tornando-se muito caro. Se diminuir a área geográfica, você acaba barateando a campanha”

       Quarto ponto, instituição de um sistema de revogabilidade de mandatos parlamentares. Pela idéia de Reguffe, o candidato teria que registrar suas propostas de campanha junto ao respectivo TRE ou TSE, que registraria em seu site, os compromissos de cada candidato. Uma vez eleito, qualquer eleitor, tendo ou não votado no parlamentar, poderia pedir, na Justiça, de volta o mandato de quem descumprisse qualquer um dos compromissos de campanha.

      O último ponto da proposta de Reguffe é a proibição de doações privadas, com o financiamento das campanhas feito exclusivamente pelo fundo de financiamento das campanhas eleitorais. Sendo esse fundo diferente do proposto no projeto de lei que hoje tramita no Congresso Nacional. Em linhas gerais, pela proposta Reguffe,  o TSE e os TREs fariam uma licitação para a contratação de gráfica e produtora que imprimiriam e gravariam o material de divulgação de todos os candidatos, com os mesmos tamanho, quantidade e formato, permitindo assim, igualdade de condições entre os disputantes das eleições. “Hoje há uma promiscuidade enorme entre público e privado”, diz ele, “e esta nova regra daria uma chance maior de uma pessoa digna disputar uma eleição, em condições menos desiguais”.

       Este é o resumo das idéias do deputado distrital e deputado federal eleito, Antonio Reguffe. O bom senso do leitor é suficiente para o juízo de valor dessas propostas. 

       Repercuto aqui, é o que poucos canais jornalísticos – televisivos, radiofônicos ou impressos - tiveram coragem de trazer a público: o “novo” que emergiu nessa última campanha eleitoral.

       E o novo incomoda. A reação dos pares de Reguffe na Câmara Legislativa do Distrito Federal, até onde sei, não foi pequena nem episódica. Foi contundente e constante. No início, as vivandeiras do “não vai dar certo” ou do “o que é que esse rapaz está querendo?” tentaram confundir, perante a opinião pública, a postura ética, honesta e acima de tudo, inovadora de Reguffe, procurando igualá-lo a Collor de Mello, caçador de marajás.

       Não colou. Pelo contrário. Quando veio à tona o suprassumo da podridão do sistema encastelado nos poderes constituídos do Distrito Federal - o escândalo do mensalão da Câmara Distrital de Brasília, que levou à prisão o governador Arruda e a quadrilha que o rodeava, formada inclusive por parlamentes - Reguffe não só passou ao largo de qualquer acusação, como influiu desde o início do processo e sua postura foi decisiva, para que tudo não terminasse em pizza, ainda que solução dada ao episódio, não tenha sido a desejada por Reguffe.

       O embate estabelecido ainda na Câmara Legislativa do Distrito Federal é a velha disputa entre a criatividade e a mediocridade, em que a mediocridade não precisa articular-se deliberadamente, porque ela já é naturalmente articulada contra o novo,  quase sempre solitário. É o medo dos medíocres se perder privilégios e favores, conquistados à socapa, nas sombras e desvãos dos sistemas podres, porque sabem que às claras não sobrevivem.

      Exerço aqui, meu papel cidadão de compartilhar informações sonegadas solenemente pelos canais de comunicação de maior audiência, por motivos óbvios. Trago as teses reguffianas para discussão, convocando meus leitores à reflexão sobre elas. Quiçá as aprimoramos e as enriquecemos, concorrendo assim, para a tão sonhada mudança das regras atuais que forçam as pessoas dignas, ainda que vocacionadas para a vida pública, a fugir do “mundo da política”, certas da  sordidez que prevalece nesse mundo, em que prevalecem os mentecaptas, com as honrosas e felizes exceções.

      Por último, externo minha angústia diante desse quadro e manifesto minha aspiração por que outros Reguffes surjam na vida nacional, para vislumbrarmos um futuro mais justo, fraterno, humanístico e sustentável, para as futuras gerações. 
 
     Reguffe é, a meu ver, a andorinha do adágio popular, que precisa com urgência, de outras andorinhas para que o verão possa ser profícuo. 

OCTAVIO PESSOA – advogado, jornalista e auditor federal de controle externo
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Comentários

Anônimo disse…
Reguffe é o Jordy do Distrito Federal. Papel muito bem interpretado por Gabeira no Rio e Soninha em São Paulo - pequenas variações no mesmo tom.

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