Nemo
Nada a ver com o Capitão Nemo.
E tudo a ver com dissídio coletivo e boa-fé.
Explico: um voto divergente do Ministro Walmir Oliveira da Costa prevalceeu em um julgamento de dissídio coletivo no Tribunal Superior do Trabalho com base na máxima nemo potest venire contra factum proprium (ninguém pode se opor a fato a que ele próprio deu causa).
Traduzindo e trocando em miúdos: a Cobra Tecnologia, depois de negociar com os trabalhadores, frustrou a solução do conflito coletivo recusando a proposta econômica, mesmo tendo conciliado todas as demais questões. No dissídio coletivo a Cobra alegou falta de comum acordo para sua propositura, que é exigida pela Constituição da República.
No voto divergente, acolhido pela maioria, o Ministro Walmir Oliveira da Costa sustentou a existência de comportamento contraditório da suscitada, à margem da cláusula geral da boa-fé objetiva prevista nos arts. 113 e 422 do Código Civil, gerando repercussões no plano do exercício regular de seu direito de oposição à via jurisdicional buscada pela suscitante, pois em sua brevíssima peça de resposta, a suscitada não alegou qualquer óbice que a impedisse de celebrar acordo coletivo parcial quanto às cláusulas anteriormente convencionadas, nem, tampouco, procurou justificar o porquê de sua veemente discordância com a resolução do dissídio coletivo pela Justiça do Trabalho, sabido que esse é o caminho natural e democrático instituído pelo legislador para que haja a pacificação dos interesses em conflito, quando frustrada a negociação coletiva, citando e transcrevendo o art. 187 do Código Civil, conforme o qual também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Esse precedente leva água para o moinho dos que entendem dispensável o comum acordo para a propositura do dissídio coletivo - aqui na Oitava Região há quem entenda que a exigência é inconstitucional - mas talvez modifique o comportamento dos negociadores patronais, que poderão passar a recusar desde o início todas as cláusulas propostas pelos trabalhadores para poder mais adiante alegar a falta de comum acordo sem risco de ser alcançado pela máxima (que é romana e antiga, mas vigente no direito brasileiro).
Para quem é do ramo ou se interessar pelo tema, o processo em que foi proferido o voto é o Recurso Ordinário em Dissídio Coletivo nº 203059/2008-000-00-00.3
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