Caminho de Nazaré. A Rota da Estrada de Ferro de Bragança - EFB
Comecei - e terminei - a primeira etapa do Caminho de Nazaré, pela Rota da Estrada de Ferro de Bragança - EFB, que já era da RFFSA velha de guerra, quando me entendi.
Confessadamente inspirado no Caminho de Santiago, vou fazer o Caminho de Nazaré com a esperança de que peregrinos - de Nossa Senhora de Nazaré ou de Santiago - ou mochileiros sigam essa Rota, que tem tudo para motivar crentes e caminhantes. Se não for sonhar muito, espero que ela um dia de torne também patrimônio imaterial do Nordeste Paraense. História e cultura é o que não falta. Falta assoprar as cinzas que recobrem as brasas.
Hoje cedo parti da Parada 29 - eu sou do tempo em que parada era... parada (e de trem) - a última estação do ramal ferroviário. Tem esse nome porque ali passa a Travessa 29 da Colônia Agrícola. Nada a ver com a quilometragem.
Seis quilômetros depois passei na Vila Tijoca, o primitivo núcleo urbano da Colônia Agrícola Benjamim Constant (a Estrada de Ferro começou a ser construída no início da Velha República e fez-lhe essa homenagem bem ao gosto dos militares positivistas). Nasci em Bragança - no Hospital Santo Antônio Maria Zaccaria, dos barnabitas até hoje - e me criei na Benjamim Constant. A velha estação do trem de Benjamim, depois de ser escola, foi abandonada e está sendo destruída. Manoela, do Museu Goeldi - que encontrei vindo de Belém para visitar Manoel Horácio, seu pai, na Benjamim - pediu que a Câmara Municipal tombe a Estação (no bom sentido). Está demorando. Pode ser que tombe materialmente antes. Incentivei-a a levantar recursos - conte comigo, Manoela - para pelo menos dar uma manutenção que impeça o processo de arruinamento. Ela ficou animada. Eu também.
A vila vinha encolhendo. Agora, com a luz elétrica, está crescendo outra vez. A casa de meus pais ainda está de pé, pela metade. A Capela de São Raimundo Nonato está bem cuidada. O Cemitério mais ou menos. Visitei o túmulo de minha avó, que era imigrante espanhola (da família Alonso, ainda hoje numerosa em Bragança). Identifiquei outros nomes de famílias tipicamente espanhóis: Turiel (galegos), Quadros e Monteiros (aportuguesados).
Mais uns poucos quilômetros e reencontro Zaíra e Rita, filhas de Manoel Borges, o lendário fabricante da melhor farinha d'água de Bragança. Zé Rodrigues, esposo de Rita, não estava. Havia saído para o batente em um de seus ônibus (aliás, o ônibus estava na casa, ele dirigia o pau-de-arara, que ainda roda nestas bandas).
Alonguei, troquei um dedo de prosa - saí ganhando, pois é sempre um prazer conversar com essas duas irmãs e relembrar o passado da velha Estrada - fiz fotos, dei mais uma pernada e cheguei na Parada Costa, hoje Parada Alta, passando batido pelo que um dia foi a Parada Laranjal, que não consegui descobrir onde era. Nem tapera existe mais.
Da Parada Alta em diante não deu mais para seguir o leito da ferrovia, porque virou caminho para um areal e ali morreu. Mais alguns metros e avistei Bragança na linha do horizonte. Penso ter visto até o Rio Caeté (acho que vi porque a maré estava alta, conferi depois).
Reencontrei o leito da ferrovia mais adiante, na Parada Jiquiri, a última antes de chegar em Bragança. Mas também não deu para prosseguir, pois virou uma quase-rua e termina pouco adiante.
Com o cansaço já batendo, cheguei a legendária Ponte do Sapucaia, sobre o Rio Caeté, que conforme a universal piada infame ruirá o dia que sobre ela passar uma virgem (uma moça, como se dizia aqui).
Atravessei a ponte e prossegui pelo que restou do traçado original até chegar na Avenida Alacid Nunes, exatamente onde ela termina, obstada pelo aterro da avenida (no Caminho de Santiago quando isso acontece fazem um túnel para os peregrinos continuem passando no ponto exato onde ele sempre esteve e continuará por muitos séculos dos séculos, amém). Arrodeio e reencontro o leito mais adiante, para chegar ao final desta primeira etapa, no exato local onde existia a imponente Estação da EFB, onde chegavam e partiam os trens da Colônia e de Belém.
Cansado mas alegre e emocionado, senti-me como viajando ao passado, meu e da região. E já aprendi uma primeira lição (tema para outro post).
Agradeço ao Juvêncio, nume tutelar dos blogueiros e titular do mais importante - com o perdão e pedido de compreensão dos demais - dos nossos blogs, pelo registro que fez.
Agradeço ao Rogério Bulhões, ao Alex e à equipe - de jovens e entusiasmados profissionais - da Rede de Televisão Paraense, que tiveram a gentileza de documentar os preparativos, a partida e a chegada desta primeira etapa do Caminho de Nazaré. Uma primeira matéria saiu poucos minutos atrás, no noticioso local (é a única emissora que tem programação local). Segunda-feira tem suíte. Espero que eles consigam documentar a passagem por Capanema, onde espero chegar no terceiro ou quarto dia.
Amanhã cedinho parto para Mirasselvas.
E conto tudo quando encontrar o primeiro cyber, caríssimos Juvêncio, Cris Moreno e Lafayette (que fica devendo uma Rota da Estrada de Ferro para jipeiros, que bem poderia sair comemorando o Centenário da Estrada).
Vejo vocês de Mirasselvas.
Confessadamente inspirado no Caminho de Santiago, vou fazer o Caminho de Nazaré com a esperança de que peregrinos - de Nossa Senhora de Nazaré ou de Santiago - ou mochileiros sigam essa Rota, que tem tudo para motivar crentes e caminhantes. Se não for sonhar muito, espero que ela um dia de torne também patrimônio imaterial do Nordeste Paraense. História e cultura é o que não falta. Falta assoprar as cinzas que recobrem as brasas.
Hoje cedo parti da Parada 29 - eu sou do tempo em que parada era... parada (e de trem) - a última estação do ramal ferroviário. Tem esse nome porque ali passa a Travessa 29 da Colônia Agrícola. Nada a ver com a quilometragem.
Seis quilômetros depois passei na Vila Tijoca, o primitivo núcleo urbano da Colônia Agrícola Benjamim Constant (a Estrada de Ferro começou a ser construída no início da Velha República e fez-lhe essa homenagem bem ao gosto dos militares positivistas). Nasci em Bragança - no Hospital Santo Antônio Maria Zaccaria, dos barnabitas até hoje - e me criei na Benjamim Constant. A velha estação do trem de Benjamim, depois de ser escola, foi abandonada e está sendo destruída. Manoela, do Museu Goeldi - que encontrei vindo de Belém para visitar Manoel Horácio, seu pai, na Benjamim - pediu que a Câmara Municipal tombe a Estação (no bom sentido). Está demorando. Pode ser que tombe materialmente antes. Incentivei-a a levantar recursos - conte comigo, Manoela - para pelo menos dar uma manutenção que impeça o processo de arruinamento. Ela ficou animada. Eu também.
A vila vinha encolhendo. Agora, com a luz elétrica, está crescendo outra vez. A casa de meus pais ainda está de pé, pela metade. A Capela de São Raimundo Nonato está bem cuidada. O Cemitério mais ou menos. Visitei o túmulo de minha avó, que era imigrante espanhola (da família Alonso, ainda hoje numerosa em Bragança). Identifiquei outros nomes de famílias tipicamente espanhóis: Turiel (galegos), Quadros e Monteiros (aportuguesados).
Mais uns poucos quilômetros e reencontro Zaíra e Rita, filhas de Manoel Borges, o lendário fabricante da melhor farinha d'água de Bragança. Zé Rodrigues, esposo de Rita, não estava. Havia saído para o batente em um de seus ônibus (aliás, o ônibus estava na casa, ele dirigia o pau-de-arara, que ainda roda nestas bandas).
Alonguei, troquei um dedo de prosa - saí ganhando, pois é sempre um prazer conversar com essas duas irmãs e relembrar o passado da velha Estrada - fiz fotos, dei mais uma pernada e cheguei na Parada Costa, hoje Parada Alta, passando batido pelo que um dia foi a Parada Laranjal, que não consegui descobrir onde era. Nem tapera existe mais.
Da Parada Alta em diante não deu mais para seguir o leito da ferrovia, porque virou caminho para um areal e ali morreu. Mais alguns metros e avistei Bragança na linha do horizonte. Penso ter visto até o Rio Caeté (acho que vi porque a maré estava alta, conferi depois).
Reencontrei o leito da ferrovia mais adiante, na Parada Jiquiri, a última antes de chegar em Bragança. Mas também não deu para prosseguir, pois virou uma quase-rua e termina pouco adiante.
Com o cansaço já batendo, cheguei a legendária Ponte do Sapucaia, sobre o Rio Caeté, que conforme a universal piada infame ruirá o dia que sobre ela passar uma virgem (uma moça, como se dizia aqui).
Atravessei a ponte e prossegui pelo que restou do traçado original até chegar na Avenida Alacid Nunes, exatamente onde ela termina, obstada pelo aterro da avenida (no Caminho de Santiago quando isso acontece fazem um túnel para os peregrinos continuem passando no ponto exato onde ele sempre esteve e continuará por muitos séculos dos séculos, amém). Arrodeio e reencontro o leito mais adiante, para chegar ao final desta primeira etapa, no exato local onde existia a imponente Estação da EFB, onde chegavam e partiam os trens da Colônia e de Belém.
Cansado mas alegre e emocionado, senti-me como viajando ao passado, meu e da região. E já aprendi uma primeira lição (tema para outro post).
Agradeço ao Juvêncio, nume tutelar dos blogueiros e titular do mais importante - com o perdão e pedido de compreensão dos demais - dos nossos blogs, pelo registro que fez.
Agradeço ao Rogério Bulhões, ao Alex e à equipe - de jovens e entusiasmados profissionais - da Rede de Televisão Paraense, que tiveram a gentileza de documentar os preparativos, a partida e a chegada desta primeira etapa do Caminho de Nazaré. Uma primeira matéria saiu poucos minutos atrás, no noticioso local (é a única emissora que tem programação local). Segunda-feira tem suíte. Espero que eles consigam documentar a passagem por Capanema, onde espero chegar no terceiro ou quarto dia.
Amanhã cedinho parto para Mirasselvas.
E conto tudo quando encontrar o primeiro cyber, caríssimos Juvêncio, Cris Moreno e Lafayette (que fica devendo uma Rota da Estrada de Ferro para jipeiros, que bem poderia sair comemorando o Centenário da Estrada).
Vejo vocês de Mirasselvas.
Comentários
Parabéns.
Abs
Acompanho tua corajosa caminhada pela "Estrada de Nazaré", desbravando décadas de esquecimento e abrindo amplas janelas para memória, esse bem tão precioso quanto menosprezado.
Caminhe firme. Conte com o apoio moral desse seu companheiro de sempre.
Abraços,
Aldenor Jr
Boa caminhada...
Bom encontro...
Boa caminhada... ao encontro.
No aperreio, cantarole uma música...
Qualquer ajuda urgente, conte comigo, vou de helicóptero (falo sério)! Mas, nada há...
Quanto ao jipe... acontecerá... a montagem dele teve que aguardar um pouco um outro projeto pesssoal, mas retorno em março... penso que em Abril ou Maio, levantaremos a trilha, com você sendo o guia-mor. (Ps.: e o Juva, que tanto pergunta pelo jipe, como zequinha! rsrsrs)
Fique e siga em paz.
Nada mais genuíno do que do fazer o caminho da estrada de ferro, que além do progresso trouxe também milhares de pessoas para trabalhar e construir a identidade desses paraenses do nordeste do Estado, uma mistura de paraora com espanhóis, portugueses e nodestinos.
Siga! E de nossa parte receba todo o apoio na divulgação de sua jornada ao passado com esperança de que se desperte para um futuro melhor, com a valorização do nosso patrimônio.
Muita luz no seu " peabiru".
Sao Payo
Eu e a Rose, minha esposa, que é da família Nonato do Almoço, vamos acompanhar tua caminhada irmão, ainda mais neste ano que a Estrada de Ferro completa 100 anos. Parabéns pela iniciativa.
o relato da sua saga no caminho de ferro da EFB é comovente.
Também fui criança de estrada de ferro, passando todas as férias na casa dos meus avós, em Rincão, interior de SP.
A estrada - Cia. Paulista de Estrada de Ferro, hoje a famigerada RFF - trazia consigo o progresso! Naquele ttempo não era preciso explicitar tanto: crescimento-com-desenvolvimento-social! A palavra "progresso" dizia sozinha isso tudo.
Estações lindas, construções sólidas, que só mesmo o descaso, mais do que o tempo, arruinou.
Rincão era uma cidade desimportante, espremida entre Araraquara e Ribeirão Preto, mas o fato de ter uma pequena estação de tem dava-lhe status. A última vez que a vi - no papel! - foi no Censo de 80, que apresentava a regressão da sua população e relação ao Censo de 1970. A estrada de ferro já estava liquidada. Com esta liquidação, foram-se parte da minha infância e da possibilidade de desenvolvimento de muitos municípios paulistas, que do seu leito bebiam o "progresso".
Espero ansiosa mais pedaços do trlho da sua trilha.
Beijos.
Caríssimos Juvêncio, Aldenor, Lafayette, Rogério, Romolo e Zé Carlos.
Puxa vida!
Os commentários de você valem a caminhada inteira!
Estou agora em Capanema, depois de ter passado por Tracuateua, Mirasselvas e Tauari, e fiquei emocionado com eles.
Sinceramente, os comentários valem mais que o post.
Valeu.
sou neta da idelvira e nossa familia ficou muito felizes em vê-lo resgatando as historias de nossa familia, minha avó muito emocionada em vê o lugar em que morava, ficamos muito gratos de trazer estas lembraças ate ela.
por: Bia, Carolina e Shirley de Alencar
Muito obrigado pela leitura, comentário e incentivo.
Vida longa para Idelvira.
Vou repetir a caminhada mais dia menos dia.