A Rota da Estrada de Ferro: de Mirasselvas a Capanema
Meu destino hoje é Capanema.
Desisti de voltar a Tracuateua e recomeçar a caminhada de dentro da fazenda. A escassez de metros que faltavam não justificava o regresso. Quando voltar a Tracuateua vou procurar Francisco para demarcar bem o trecho final dentro da fazenda.
Recomecei do lugar onde a antiga ferrovia se une com a rodovia e nesta prossigo, passo sobre a ponte sobre o belíssimo Rio Quatipuru - cheião - despeço-me de Flávio, faço fotos da estação e passo rapidamente com Isolina para as despedidas.
De Mirasselvas até Igarapé Apara, 4 kilômetros depois, a rodovia não segue o traçado da ferrovia. Mas aqui e acolá se aproximam e dá para identificar os cortes da ferrovia, retomados pela capoeira.
O tempo nublado favorece a caminhada. Assim, vou reencontrando trechos ora à esquerda, ora à direita, até chegar a Tauari, onde a antiga estação está de pé e modificada, com a plataforma transformada em alpendre com balaustrada de cimento e rampa para deficientes. Nas paredes, vistosas pinturas do trem - uma composição completa - reaviva a memória. Ficamos devendo essa ao Prefeito de Capanema.
Na saída de Tauari reencontro Alex, da Rede Paraense de Televisão, para nossa alegria. Apresenta-me amigos, que dão-me informações. Daqui por diante abandono a rodovia asfaltada e sigo pela estrada de terra que é exatamente o antigo leito da ferrovia.
Logo começa a chover forte. E assim foi até a entrada de Capanema, doze quilômetros depois. Capa e botas apropriadas ajudam, mas não fazem milagres. Logo a água escorre pelo cano da bota. Transponho os lugares mais difíceis no estribo da caminhonete, que agora se adianta a cada três quilômetros ou até o primeiro desses obstáculos.
A pé vemos detalhes que não percebemos de carro. Nesse trecho encontro um dos mais belos buritizais da Rota. Ontem encontrei outro lindíssimo, perto de Tracuateua. Como os igapós estão cheios e os buritizeiros estão carregados de frutos, vistos assim, a pé, são muito mais belos. Lembram as veredas de Rosa. Só que mais bonitas que as de Minas e Goiás. Essas belezas só se revelam para quem caminha a pé. Acreditem.
A propósito, em Bragança se toma vinho de buriti do mesmo modo que se toma açaí. E se bate na mesma máquina. Onde tem um, na safra - que se aproxima - tem outro. Com farinha d'água, açúcar e camarão seco é uma iguaria que a alta cozinha precisa descobrir.
A medida que me aproximo de Capanema vão aparecendo casas, algumas de palha de najá (e Bragança não se diz inajá). E crianças. Muitas crianças. Que me olham curiosas e respondem ao meu bom-dia com um oi. Como é domingo, encontro famílias que vão para o culto. Ou visitar amigos. Ou dar uma volta na cidade ou vila próxima. A pé ou de bicicleta. Nesta região a sagrada família tem pai, mãe, filhos - muitos - e... curió.
Já chegando em Capanema uma pracinha no barrio Caixa D'Água - que suponho ser referência à mais uma caixa d'água do trem - tem outra pintura do trem, no mesmo estilo da de Tauari. Ficamos devendo mais essa ao Prefeito. Que assim contribui para um esforço - que poderia ser de todos - de preservação da memória da ferrovia e do passado do Nordeste do Pará. Quem não tem memória, paga um preço alto pelo olvido, mais dia, menos dia. Bom seria se a Rota da Estrada de Ferro se tornasse um itinerário cultural e, se não fosse pedir muito, mais adiante - depois de recuperado e preservado o patrimônio material que resta ao longo dela - em patrimônio imaterial.
E por falar em Prefeito, tenho um apelo a fazer para o de Tracuateua: não faça aterro sanitário no leito da ferrovia, por favor. Que ela tenha sido extinta porque deficitária, vá lá que seja. Mas não precisa virar lixão. E é isso o que ela está se transformando, na saída da cidade, logo depois do balneário Riacho Doce. Está feito o apelo e fechado o parêntesis.
Acionados por Rogério e Marcelo Bulhões e Alex, a equipe de Capanema da Rede de Televisão Paraense documenta a parte final dessa etapa da caminhada.
Aliás, peço, aqui mesmo, ao Rogério, que considere a possibilidade de fornecer essas imagens, brutas e editadas, ao Museu de Arte Sacra da Diocese de Bragança, como parte das comemorações do Centenário da Estrada de Ferro. Se possível, produza um documentário sobre o tema. Os bragantinos agradeceremos.
Sob chuva o rendimento é bom, porque a temperatura favorece. Cheguei no horário estimado, duas da tarde. Bem a tempo de achar hotel e restaurante aberto.
E com tempo para cuidar das bolhas e botas encharcadas.
Nos reencontraremos amanhã, em Igarapé-Açu, se tiver cyber por lá.
Desisti de voltar a Tracuateua e recomeçar a caminhada de dentro da fazenda. A escassez de metros que faltavam não justificava o regresso. Quando voltar a Tracuateua vou procurar Francisco para demarcar bem o trecho final dentro da fazenda.
Recomecei do lugar onde a antiga ferrovia se une com a rodovia e nesta prossigo, passo sobre a ponte sobre o belíssimo Rio Quatipuru - cheião - despeço-me de Flávio, faço fotos da estação e passo rapidamente com Isolina para as despedidas.
De Mirasselvas até Igarapé Apara, 4 kilômetros depois, a rodovia não segue o traçado da ferrovia. Mas aqui e acolá se aproximam e dá para identificar os cortes da ferrovia, retomados pela capoeira.
O tempo nublado favorece a caminhada. Assim, vou reencontrando trechos ora à esquerda, ora à direita, até chegar a Tauari, onde a antiga estação está de pé e modificada, com a plataforma transformada em alpendre com balaustrada de cimento e rampa para deficientes. Nas paredes, vistosas pinturas do trem - uma composição completa - reaviva a memória. Ficamos devendo essa ao Prefeito de Capanema.
Na saída de Tauari reencontro Alex, da Rede Paraense de Televisão, para nossa alegria. Apresenta-me amigos, que dão-me informações. Daqui por diante abandono a rodovia asfaltada e sigo pela estrada de terra que é exatamente o antigo leito da ferrovia.
Logo começa a chover forte. E assim foi até a entrada de Capanema, doze quilômetros depois. Capa e botas apropriadas ajudam, mas não fazem milagres. Logo a água escorre pelo cano da bota. Transponho os lugares mais difíceis no estribo da caminhonete, que agora se adianta a cada três quilômetros ou até o primeiro desses obstáculos.
A pé vemos detalhes que não percebemos de carro. Nesse trecho encontro um dos mais belos buritizais da Rota. Ontem encontrei outro lindíssimo, perto de Tracuateua. Como os igapós estão cheios e os buritizeiros estão carregados de frutos, vistos assim, a pé, são muito mais belos. Lembram as veredas de Rosa. Só que mais bonitas que as de Minas e Goiás. Essas belezas só se revelam para quem caminha a pé. Acreditem.
A propósito, em Bragança se toma vinho de buriti do mesmo modo que se toma açaí. E se bate na mesma máquina. Onde tem um, na safra - que se aproxima - tem outro. Com farinha d'água, açúcar e camarão seco é uma iguaria que a alta cozinha precisa descobrir.
A medida que me aproximo de Capanema vão aparecendo casas, algumas de palha de najá (e Bragança não se diz inajá). E crianças. Muitas crianças. Que me olham curiosas e respondem ao meu bom-dia com um oi. Como é domingo, encontro famílias que vão para o culto. Ou visitar amigos. Ou dar uma volta na cidade ou vila próxima. A pé ou de bicicleta. Nesta região a sagrada família tem pai, mãe, filhos - muitos - e... curió.
Já chegando em Capanema uma pracinha no barrio Caixa D'Água - que suponho ser referência à mais uma caixa d'água do trem - tem outra pintura do trem, no mesmo estilo da de Tauari. Ficamos devendo mais essa ao Prefeito. Que assim contribui para um esforço - que poderia ser de todos - de preservação da memória da ferrovia e do passado do Nordeste do Pará. Quem não tem memória, paga um preço alto pelo olvido, mais dia, menos dia. Bom seria se a Rota da Estrada de Ferro se tornasse um itinerário cultural e, se não fosse pedir muito, mais adiante - depois de recuperado e preservado o patrimônio material que resta ao longo dela - em patrimônio imaterial.
E por falar em Prefeito, tenho um apelo a fazer para o de Tracuateua: não faça aterro sanitário no leito da ferrovia, por favor. Que ela tenha sido extinta porque deficitária, vá lá que seja. Mas não precisa virar lixão. E é isso o que ela está se transformando, na saída da cidade, logo depois do balneário Riacho Doce. Está feito o apelo e fechado o parêntesis.
Acionados por Rogério e Marcelo Bulhões e Alex, a equipe de Capanema da Rede de Televisão Paraense documenta a parte final dessa etapa da caminhada.
Aliás, peço, aqui mesmo, ao Rogério, que considere a possibilidade de fornecer essas imagens, brutas e editadas, ao Museu de Arte Sacra da Diocese de Bragança, como parte das comemorações do Centenário da Estrada de Ferro. Se possível, produza um documentário sobre o tema. Os bragantinos agradeceremos.
Sob chuva o rendimento é bom, porque a temperatura favorece. Cheguei no horário estimado, duas da tarde. Bem a tempo de achar hotel e restaurante aberto.
E com tempo para cuidar das bolhas e botas encharcadas.
Nos reencontraremos amanhã, em Igarapé-Açu, se tiver cyber por lá.
Comentários
O local, por ali, é conhecido como lago ou balneário do baiano. Dista da estrada principal uns 300 metros, ou menos...
Mas se não der, iremos lá no futuro!
Grande abraço
José Carneiro
jqcarneiro@uol.com.br
Estamos acompanhando a sua caminhada " na trilha dos trilhos " e aguardamos com ansiedade para ver estes registros fotograficos , quem sabe em uma exposicao ....
Sucesso...
tinha razão o Gonzagão, né? Pelo menos neste trecho:
"... mas o pobre vê na estrada o orvalho beijando a flor,
vê de perto o galo campina que quando canta muda de cor.
Vai molhando os pés no riacho - que água fresca, Nosso Senhor - vai olhando coisa a granél,
coisas que pra modo de ver,
um cristão tem que andar a pé..."
Boa caminhada.
Beijo
Que grata surpresa encontrar esta notícia em seu blog. Louvável iniciativa. Parabéns e sucesso no percurso.
Aproveito e revivo este poema (METAMORFOSE DE BRAGANÇA)do Eduardo Lauande sobre Bragança, onde tem raizes.
Grande abraço,
Dário
Nas ruas que fluíam da noite
já não se cantavam cirandas.
Aos poucos se foram as meninas
e suas cantigas de roda.
Nas faces cálidas, infantis,
brilhavam olhos inocentes,
por onde espreitavam mulheres
ocultas, insuspeitas...
As ruas que fluíam da noite
ficaram de vez vazias.
As areias da rua correram
entre os dedos sutis das horas
e quando amanheceu,
o sol e o vento brincaram
nos cabelos das quase-mulheres.
No decorrer do dia tornaram-se
mulheres feitas, fartas, fortes...
Nas ruas que fluíam da noite
já não se cantavam cirandas.
Estamos esperando notícias.
Cheguei a Igarapé-Açu levemente estropiado e fiquei na casa do meu primo Aldemiro Alencar, fora do centro e longe do cyber.
Prestadas as contas, ao Lafayette respondo que rastreei a Lagoa Azul do baiano, entrada ao lado do Cemitério de S. Luis, mas não dava para passar lá, pois tinha que encarar 33 km até Igarapé-Açu.
Zé Carneiro, vamos sentar para um papo presencial. Estou grato a você - como todos os bragantinos - e quero ter acesso ao seu material e ver o que posso fazer para somar à sua iniciativa. Telefone-me (4008-7024) ou mande-me uma mensagem (jose.alencar@trt8.gov.br) para marcar um dia para esse encontro, para mim venturoso, caríssimo.
Raul, não sei se tenho talento para fazer fotos que mereçam uma exposição. Mas pelo menos para fazer fotos amadoras e colocar em um fotoblog vou tentar. O Centenário da Estrada de Ferro de Bragança merece.
Caríssima Bia, obrigado pela companhia - sinto que você está me acompanhando - e pela poesia. O filho de Januário sabia das coisas. Realmente, caminhando se vê mais e melhor. A paisagem pode ser a mesma, mas o olhar não. E os detalhes. Ah, os detalhes. Coisas imperdíveis, que de um automóvel seriam irrelevâncias. Uma florada de malícia (ou maliça, como se diz aqui, e sensitiva lá para as bandas do Sul). Ou um cutiribá madurinho que se esborracha levemente na areia fofa deixada pela enxurrada de ontem à noite. Um mesmo um lustroso imbuá vermelho que se arrisca na travessia do caminho de terra (atenção: imbuá é o nome que se dá em Bragança para um miriápóde, uma centopéia mansa, que não faz mal prá ninguém).
Dário, amigo, o Lauande tinha Bragança no DNA. E faz falta, amigo. Boa lembrança. Obrigado.
Zé Carlos, amigo, voltei à blogosfera. Mas continuo no estirão.
Brunno Levy - Televive Comunicações
producaosbtcapanema@hotmail.com
Você é inesquecível, amigo.
Afinal, você e Rogério foram os segundos - primeira foi Araceli, claro, que neste momento grava seu um programa de rádio em Castanhal com o Rogério - que era possível caminhar da Parada 29 até Belém em dez dias...
Este ano vou voltar ao Caminho de Santiago, para seguir a rota aragonesa, que se junta com a rota francesa em Puente La Reina.
Você pode seguir minhas pegadas a partir do dia 15 de abril aqui mesmo no blog. Espero chegar a Santiago de Compostela no dia 16 de maio e caminhar mais três dias até Finisterre.
Depois vou atrás dos rastros de minha avó Felipa - você conheceu o túmulo dela no cemitério de Benjamin Constant - em Zamora.
Estou pensando em voltar a fazer o Caminho de Nazaré - Rota da Estrada de Ferro de Bragança em junho, depois que voltar do Caminho de Santiago.
Um amigo meu vai ser o emissário de uma proposta minha ao bispo de Bragança: ele anima espiritualmente o Caminho de Nazaré e eu me disponho a auxiliá-lo fisicamente, prestando, digamos, consultoria técnica aos peregrinos.
Confirmo isso depois.
Mas a volta ao Caminho de Santiago é certa, certíssima.
Uma amiga e um amigo - irmãos - vão fazer a rota francesa pela primeira vez. Nos juntamos em Puente La Reina.
Fico feliz em ser fonte de inspiração para você.
Desejo que isso ajude seu sucesso na sua carreira.
Peça para o Rogério gravar um DVD com essa reportagem (com make off).
Felicidades, amigo.