Notícias de Lima (7)
Hoje tirei o dia todo para caminhar por Miraflores e San Izidro.
Subo a avenida Pardo até o mercado, logo depois do Paseo de la República, onde o alcalde está construindo um sistema de ônibus em calhas segregadas. É cópia do modelo de Curitiba. Antes de Lima o modelo foi copiado em Bogotá, Barranquilla e outras cidades colombianas. Quito também copiou. Só no Brasil o modelo nao foi copiado. Em Belém nem pensar. Santo Lerner de casa nao faz milagre.
O mercado está passando por obras na parte externa. No interior continua o de sempre, com tudo o que se possa imaginar. Quem tem coragem pode comer ceviche nos boxes do mercado. Antigamente barraquinhas - chiringuitos - infestavam o entorno do mercado. Depois da epidemia de cólera parece que a coisa ficou mais controlada e nao vi mais os vendedores de ceviche nas ruas. A variedade deste mercado é também impressionante. Só de milho contei mais de dez variedades em apenas dois boxes. Batatas idem. Cada uma com seu nome próprio. E ai de quem chamar camote de papa. Tem uma abóbora gigantesca, amarelo claro, com casca bem verde. Flores, muitas flores. Os peruanos herdaram dos incas o gosto pelas oferendas florais (como os mexicanos dos aztecas).
Retorno à Avenida Pardo e dou uma passada na Saga Falabella, a loja de departamentos que tem filiais aqui, em Santiago e Buenos Aires. Todas as grifes estao aqui e os preços sao camaradas. Estranhamente nao encontrei Lacoste.
Cambo para a direita, rumo a Huaca Pucllana, que agora vou visitar de verdade. Espero a hora da visita guiada. Quando passei aqui vinte e tantos anos atrás a pirâmede era usada para corridas de motocross e mountain bike. A elite peruana construiu suas casas sobre dois terços da pirâmide. E agora uma rua corta uma ponta do terço restante. Fico com a impressao que estamos fazendo o mesmo com a floresta amazônica e sinto-me tao tosco como um peruano de oitenta anos atrás. Soube que em Cuzco as pessoas pagavam uma taxa para a Municipalidad e podiam carregar quantas pedras conseguissem de Sacsayhuaman. Nao percebiam a riqueza que estavam destruindo. Agora restauram o que por inciência destruiram. Acho, repito, que estamos fazendo a mesma coisa com a floresta amazônica.
Huaca Pucllana é bem interessante porque é de adobe, resiste aos terremotos e é das mais antigas ruínas do Peru. As referências aqui sao com o mar (ondas e tubaroes). Os banquetes cerimoniais eram feitos com tubaroes. Os sacrifícios humanos eram de mulheres e crianças.
Terminada a visita vou ao famoso restaurante Huaca Pucllana, frequentado pela fina flor da elite limenha. Vou de Pisco Sour e o ceviche Pucllana. É um ceviche misto, com molho de aji amarelo que combina com o milho tostado e com o choclo, guarnecido de pedaços de macacheira (inclusive duas crocantes tiras finas fritas) (no cardápio está descrito como Ceviche Pucllana de pescado, conchas, langostinos y pulpo, con su toque de ají amarillo, sobre bastones de yuca, choclito y cancha). No alto do prato, dois ou três raminhos de salsa (perejil). Simplesmente o máximo. O restaurante faz jus a fama. De sobremesa, sorvete de lúcuma, aparentada da sapotilha. Nao é assim um sorvete Cairu, mas é muito bom e muito bem apresentado em uma taça com duas bolas e uma galletita crocante de kiwicha (amaranto). Tudo, gorjeta incluído, por algo como 64 reais.
Resolvo caminhar até San Isidro, a vizinho bairro dos bacanas de Lima que está se tornando também um bairro comercial. Enquanto o centro decai San Isidro e Miraflores florescem (espero que um dia a Guanabara/Ananindeua seja nossa Miraflores, se nao for querer muito). Passo pelo El Olivar, um bosque com centenas de oliveiras, algumas delas seculares. O contraste com a miséria dos pueblos jóvenes pode ser chocante, mas certo é que a burguesia limenha teve competência para fazer dois bairros para viver bem. Aqui nao parece que estamos em uma capital sulamericana. É mais ou menos como Polanco ou Lomas de Chapultepec, na cidade do México. Topo com a Embaixada de Cuba, em pleno Olivar. Caminho despreocupado rumo a Huaca Huallamarca, a pirâmide de adobe de San Isidro, salva graças a dedicaçao de um médico que se tornou arqueólogo e antropólogo. Está sendo restaurada e já atrai turistas.
Caminho sem pressa entre as mansoes e lojas chiques de San Isidro, de volta para Miraflores.
Acho que vou dormir cedo porque amanha tenho de acordar também cedo e partir para Iquitos.
Agora vou conhecer la selva, a Amazônia peruana, um sonho antigo.
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