Elogio ao Mínimo

Depois de anos cultivando a prolixidade máxima, os juristas estamos fazendo o caminho de volta.
Pepe é um juiz do trabalho mineiro por quem tenho grande admiração intelectual e maior estima pessoal. Dia desses postei aqui o link para sua tese de doutorado. Ele é um dos que fazem o combate ao juridiquês e à prolixidade de todos nós, operadores do direito. O elogio ao mínimo abaixo transcrito é dele. Vale a pena lê-lo e, para quem é do ramo, colocar em prática.
De minha parte quero dizer que, depois de anos de prolixidade, valorizo cada vez mais a concisão, até por uma razão simples: é mais eficaz. Quem tem o que dizer de verdade, podê fazê-lo em poucas linhas, sem perda de substância e sem prejuízo conceitual. Antes pelo contrário. Textos longos confundem e tornam-se atécnicos. Não se pode redigir uma petição ou uma sentença como se cada um de nós fosse um Saramago.
Assim, quem quer praticar redação forense eficaz, pode esquecer a prolixidade e adotar a concisão.
Vejam o que escreveu Pepê.

O Mínimo é o Máximo! – a concisão como novo princípio do processo judicial

 

José Eduardo de Resende Chaves Júnior [1]

 

Tenho duas sugestões na matéria. A primeira importa em cortar na própria carne. Petições de advogados devem ter um limite máximo de páginas. (...).  

Einstein gastou uma página para expor a teoria da relatividade. É a qualidade do argumento, e não o volume de palavras, que faz a diferença.

A segunda sugestão corta em carne alheia. A leitura de votos extremamente longos, ainda quando possa trazer grande proveito intelectual para quem os ouve, torna os tribunais disfuncionais.

 

Luis Roberto Barroso

 

 

Necessitamos com urgência de um minimalismo jurídico. Peças e fundamentos com objetividade e organização são avis rara nas comarcas e tribunais. A prolixidade vem sendo vendida e cultivada como sinal de cultura e erudição jurídica.

 

Mas na era da abundância da informação, toda concisão é virtude. Minha filha me ensinou que saímos da geração Coca-Cola, para a geração Copy-Cola... 'Control c' e 'control v' infundem uma verborragia virtual, que tumultua o processo, esconde a realidade dos fatos e dilui o que é essencial para se dirimir a lide. Em geral, quem tem razão é sintético e claro.

 

Na era da informação em rede, para se estender o pensamento, basta o hipertexto - HTML (HyperTextMarkup Language). Não precisamos mais do texto: a conexão vale mais do que mil palavras.

 

Com o processo virtual, criado pela Lei 11.419/2006, alinguagem de marcação - markup language – vai tornar o processo judicial cada vez mais reticular, maisplugado com o passado, o futuro e com a instantaneidade. O velho apotegma do Século XIII, de que ‘o que não está nos autos, não está no mundo’, não vigora mais na novel ciência processual eletrônica. O que está no Google está potencial e virtualmente nos autos eletrônico.

 

No novo processo a busca pela verdade real será substituída pela busca da verdade virtual, da hiper-realidade. A loquacidade mediática tomará lugar e voz , em boa hora, do texto. Papel aceita tudo.

 

O excesso de linguagem é tão autoritário quanto o silêncio, que, ao contrário, na maioria das vezes é mais eloqüente. A pichação só tem eficácia no muro em branco. No muro livre, saturado de pichações, nenhuma nova inscrição causa efeito algum. Liberdade saturada de expressão no processo é ruído e, não, mensagem.   

 

O processo contemporâneo clama pelo princípio da concisão, pela revolução da brevidade de Luis Roberto Barroso, o jurista carioca que nos lembra que a teoria da relatividade foi redigida e apresentada apenas em uma lauda. A logorréia bacharelesca é uma nova forma de assédio processual.

 

Na contemporaneidade, o processo justo é o processo sucinto, organizado e célere. Nenhum direito é absoluto e sem medida. E a medida da moderação lingüística nos autos não é tão subjetiva. O bom senso é uma medida eminentemente coletiva. O critério de adequação das atitudes é uma nota distintiva do próprio ser humano.

 

Além disso, a lógica jurídica é incapaz de processar o turbilhão de fundamentos e (des)arrazoados que impunemente são despejados nos autos.

 

novilíngua de Orwell (newspeak), o idioma fictício, criado pelo Partido autoritário em sua obra literária1984que se desenvolvia não pela criação de novas palavras, mas pela condensação delas, subestimava a capacidade combinatória dos signos lingüísticos. Para o poeta Ezra Pound, por exemplo, poesia é condensação. Alguém tem dúvida da potência transformadora da poesia?

 

Processo com poesia e justiça material. Está feito o manifesto!



[1] José Eduardo de Resende Chaves Júnior, Juiz do Trabalho, Titular da 21ª Vara de Belo Horizonte, Doutor em Direitos Fundamentais pela Universidade Carlos III de Madrid. Vice-presidente da Rede Latino-americano de Juízes -www.REDLAJ.org e do Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho - IPEATRA. Coordenador do GEDEL - Grupo de Estudos Justiça e Direito Eletrônicos da Escola Judicial do TRT-MG.

Comentários

Anônimo disse…
Alencar, sempre tento reduzir minhas peças. Atualmente minha média está em 10 laudas (Arial, fonte 11 ou 12, entre linha: múltiplo de 1,2.

Porém, meu caro, redução de texto e argumento em peça judicial é um perigo.

Sem combinar com os russos, será prato cheio!!!

A idéia é ótima e bem-vinda, mas se não se sentar na mesa, advogados e juízes, aqueles continuarão a escrever, escrever, e este continuarão a sentenciar: "isto não foi matéria exposta na defesa, na inicial, no recurso", ou "isto não está claro nos argumentos", ou "isto é inovação", ou "a súmula fulana de tal, a orientação sicrana das quantas, diz que...".

Têm casos que o advogado explica, explica, explica e o juiz não entende, não entende, não entende (e vice-e-versa, mas, neste caso, manda que tem o poder).

Comigo já me aconteceu de escrever simplesmente (em outras palavras que não me lembro agora): "Requer realização de perícia médica no reclamante, pois alega limitação motora nos movimento da perna direita, em face de acidente do trabalho". E a juíza, em audiência: "Favor levantar e andar até o fim da sala. Este juízo verifica, in loco a veracidade da alegação do reclamante. Indefere-se o pedido de perícia da reclamada. Sob protesto."

Não adiantou, no RO dizer tudo o que tu podes imaginar. Todos os princípios. Argumentos técnicos, científicos, espirituais. Nada. A turma confirmou. E mais, a Revista só subiu com AI!!!

Te juro, ao invés de escrever laudas e laudas no RO, quase que escrevo o preâmbulo e, após, a palavra "ABSURDO", em fonte 50! Pra mim era o suficiente, né não?

De-me os fatos e tal-e-coisa-e-coisa-e-tal. Isto não funciona. Tá lá no CPC, dizendo que não pode ser assim.

Outra coisa. Conhecias o Marcelo Iúdice, procurador do município que morreu ontem, assassinado? Conhecia da lida do dia-a-dia. Parecia-me ser uma pessoa tranquila, uma boa pessoa. Um lástima!
JOSE MARIA disse…
Meu caro Lafayette, o gatilho mais rápido da blogosfera.

Claro que ainda vão passar muitos pleonasmos por baixo da ponte e o juridiquês não vai ser erradicado facilmente. Ele não é mais uma erva invasora da linguagem forense, é uma floresta a ser desbastada (pelo menos essa eu estou de acordo).
Mas agora parece que a coisa vai, pois são os próprios magistrados, por sua maior associação, a AMB, que estão combatendo as duas pragas, o juridiquês e a prolixidade. Tenhamos paciência e persistência.
Quanto à violência, estou reunindo informações para um post sobre o tema.
Lastimo mais uma vida perdida e sei que temos de fazer alguma coisa.
Pela primeira vez em muitos anos, estou com a sensação de que em um bom combate estamos - nós, do bem - sendo derrotados.
Anônimo disse…
Estou como um monge e um enfermo... paciente! rsrsrs

Será que iremos nos encontrar, novamente, numa passeata? Até quando?
Anônimo disse…
NOTÍCIA DO BLOG DO CLÁUDIO HUMBERTO
09/01/2009 | 00:00
Pedófilo do Pará é processado na Paraíba
O deputado estadual do Pará Luiz Afonso Sefer (DEM), acusado do crime de pedofilia contra uma criança de nove anos, é réu em ação no Tribunal de Justiça da Paraíba sobre reconhecimento de paternidade. O processo, que teve início em meados de 2005, tramita em segredo de Justiça e nenhuma audiência foi realizada até agora. Quando a criança nasceu, a mãe teria apenas 15 anos de idade.
Anônimo disse…
Alencar, meu nervo ciático não me deu escolha: ou deitas (certo que sem posição possível), ou ficarei aqui, perene, inflamado, latejando e doendo pacas.

Estou aqui, prostrado. E tenho que ficar bom, pois segunda, cedo, tenho audiências, e lá no escritório não tenho direito ao adoecimento (vou processar a mim mesmo!!! rsrssr)

Outras reuniões virão, e estarei lá (se o ciático deixar, é claro).
JOSE MARIA disse…
Lafayette,

Sua ausência é perfeitamente justificada e foi aceita pelos convivas, inclusive o Papa dos blogs, nosso companheiro Juvêncio.
Seu pai quase chega lá.
Saúde, camarada.

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