Notícias da Ilha dos Uros

É impossível nao simpatizar com os uros.
Eles se dizem o povo mais antigo da terra e teriam chegado aqui na beira do Lago Titicaca antes do sol e da lua. Dizem também que graças ao seu sangue nao afundam e nao podem ser atingidos por raios.
Eles já viviam nas margens do Titicaca quando foram alcançados pela expansao do império inca, a qual resistiram abandonando a terra firme e construindo ilhas flutuantes de totora (junco). O sólido império inca foi desmanchado, mas os uros estao até hoje nas suas ilhas e vao muito bem obrigado. É verdade que o último uro puro morreu nos anos cinquenta do século passado e os atuais uros na verdade se miscigenaram com aimaras, de quem adotaram a língua.
Passei parte da manha de ontem em uma dessas ilhas com um grupo de turistas europeus e canadenses. O encantamento já começa na chegada, com a visao de um arco de totora e as cabanas onde vivem. Sentados em um semicírculo - em um banco de totora, por supuesto - com a ajuda do guia Richard - um legítimo quechua simpático como todos - nos mostram a totora, da qual aproveitam tudo, inclusive um palmito que nao pude experimentar. No passado eles cortavam os blocos flutuantes de raiz totora com uma corda mas agora usam serrotes. Rebocam os pedaços para o local escolhido, amarram uns aos outros e ancoram com poitas e varas. Depois lançam sucessivas camadas de totora, formando as ilhas sobre as quais constroem suas cabanas de seis metros quadrados mais ou menos, feitas com esteiras de... totora, claro. Nos mostram em seguida seu artesanato de totora (mobiles) e tecidos de la (de ovelha e alpaca) e o produto de sua pesca (carachi, do tamanho de uma sardinha). Por um furo no centro da ilha no mostram com um fio de prumo a profundidade do lugar: dez metros contados. Nos levam para conhecer suas casas e suas famílias, quase todas com painéis solares (para iluminaçao, rádio e TV). Na verdade cada ilha pertence a uma familia. Na cabana que visitei viviam seis pessoas, inclusive o bebê de cinco meses da jovem Norma. As crianças uros sao lindamente rechonchudas. Dela comprei um chullo (aquele gorro típico dos Andes) e uma chompa (camisa de manga comprida) para bebê e mostrando interesse nas chompas dos adultos ela me conseguiu uma com um vizinho. Mais uma para minha coleçao de roupas étnicas.
Nos convidam para navegar até outras ilhas em uma balsa (de totora, óbviamente) parecida com a famosa Kontiki (melhor dizendo, a Kontiki é que se parece com as balsas dos uros, com aquele jeitao viking). Nos despedem perfilados no cais cantando cançoes em aimara, ingles e frances. Navegamos calmamente pelo canal até chegar em outra ilha com posto de observaçao, restaurante e uma jaula onde criam trutas arco-iris. Nos mostram suas escolas, onde professores e alunos chegam de balsa.
Os uros resistem bem a uma nova invasao, a dos turistas. Na verdade o turismo ajuda a manter seus costumes e sua cultura e fica claro que sem o turismo os mais jovens abandonariam seu estilo de vida tradicional.
Com os uros aprendemos que a vida pode ser vivida com pouco.
Na metade do caminho entre a civilizaçao dos uros e a nossa deve estar a virtude necessária para viver sem destruir o planeta. Essa é a liçao que aprendemos nessa manha com os uros.

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